Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, de suspender, em 14 de abril, as centenas de milhares de ações que pedem o reconhecimento do vínculo empregatício em contratos de trabalho como Pessoas Jurídicas (PJs), a chamada “pejotização”, vai retirar todos os direitos dos trabalhadores, prejudicar o combate ao trabalho escravo, impossibilitar a aplicação da Lei da Igualdade Salarial e o preenchimento de cotas para a contratação de Pessoas com Deficiência (PCD), por parte das empresas, além de impactar nas contas públicas, alertam a Associação Brasileira da Advocacia Trabalhista (Abrat), entidade que articulou a Mobilização Nacional em Defesa da Justiça do Trabalho, e o Ministério Público do Trabalho (MPT), que embora não faça parte dessa mobilização é um órgão de defesa dos direitos trabalhistas.
Sem o reconhecimento de vínculo empregatício, com a pejotização irrestrita, as empresas ficarão livres para contratar trabalhadores e trabalhadores sem direito algum, permitindo que, por exemplo, as mulheres, que já recebem menos que os homens, fiquem impossibilitas de serem beneficiadas pela lei, assinada pelo presidente Lula, que torna obrigatória a igualdade salarial entre homens e mulheres que exercem a mesma função. Sem registro em carteira é impossível saber a diferença salarial. As mulheres também perderão o direito à licença-maternidade.
Outro impacto é no combate ao trabalho análogo à escravidão. Quando empregadores são flagrados explorando os trabalhadores uma das indenizações a serem pagas são os direitos trabalhistas, mas com a pejotização irrestrita eles podem dizer que o “contrato” foi verbal. A pejotização permite que os contratos possam ser feitos verbalmente, sem necessidade de um documento assinado entre as partes. Desta forma, os trabalhadores resgatados nessa situação ficarão sem indenização trabalhista.
Um exemplo foi a decisão de um juiz no Pará que suspendeu uma ação do MPT, de trabalho análogo à escravidão, por entender que o caso se enquadrava em pejotização irrestrita, cujos julgamentos foram suspensos pelo ministro Gilmar Mendes, conta o procurador Renan Bernardi Kalil, coordenador nacional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret), do órgão.
“Quando você encontra uma pessoa em condições análogas à escravidão, o empregador pode dizer que contratou como PJ [Pessoa Jurídica], mas não existe resgate de pessoa jurídica. Uma pessoa jurídica não vai ser escravizada, quem é escravizado é o ser humano, é o homem ou é a mulher que está trabalhando naquelas condições”, exemplifica Kalil.
Apesar dessa decisão, o procurador do MPT orienta que o trabalhador que teve um contrato de trabalho fraudulento faça o ajuizamento da ação, porque dependendo do tempo em que ele realizou a atividade pode acontecer a prescrição do processo e de seus direitos.
“O prazo para que o trabalhador ajuíze a ação é de dois anos após a sua saída da empresas, mas já teve casos que ficaram mais de um ano suspensos no Supremo. Então, toda a cautela é pouca, e o trabalhador não pode contar com a expectativa de uma decisão mais imediata”, afirma Kalil.
Hoje os inquéritos civis e investigações em curso do MPT sobre contratos fraudulentos são 4.708. Esses números são diferentes das associações trabalhistas porque o órgão trabalha com ações coletivas e não individuais.
A pejotização também impede o cumprimento de cotas para a contração de Pessoas com Deficiência. Hoje a legislação determina que empresas com 100 a 200 empregados, tenham uma reserva legal é de 2%; de 201 a 500, de 3%; de 501 a 1.000, de 4%. As empresas com mais de 1.001 empregados devem reservar 5% das vagas para esse grupo. Sem a carteira assinada o número de da folha de contratações diminuirá, impactando no índice a ser preenchido. Esses são apenas três exemplos do que pode ocorrer com os trabalhadores.
As consequências do trabalho sem carteira assinada também serão nefastas para a arrecadação do FGTS, da Previdência, de impostos e outros tributos necessários para a economia do país.
Abrat reage
Diante da gravidade desse quadro, a presidente da Associação Brasileira da Advocacia Trabalhista (Abrat), Elise Correia, se reuniu com a Associação Nacional das Magistradas e Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e a Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho (ANPT), para darem início à Mobilização Nacional em Defesa da Justiça do Trabalho. O movimento recebeu apoio da CUT e das demais centrais sindicais.
As pessoas, os acidentados, não terão previdência para pedirem o afastamento. As pessoas não têm noção da dimensão dessa decisão e não é um impacto para daqui a 10 anos, é para daqui dois, três anos. E serão enormes, as pessoas não terão 13º para injetar na economia do país. Não vai ter FGTS, nem seguro-desemprego. Por isso que é importante que os trabalhadores tenham um vínculo empregatício- Elise Correia