Respeito mas discordo das opiniões que tentam relativizar o impacto terrível das eleições dos EUA para a população de todo o planeta.
Mesmo no campo popular, democrático e de esquerda, brotam em profusão análises dando conta de que nada muda com a vitória do magnata nazifascista.
Pior : não é difícil encontrar quem enxergue na vitória de Trump elementos positivos, tais como a hipotética postura menos protecionista de governos republicanos anteriores ou a derrota do establishment financeiro e militar dos EUA que apoiou Hillary.
Quem repete o mantra segundo o qual tanto faz democratas ou republicanos o faz identificando semelhanças nas políticas externas expansionistas e intervencionistas dos governos dos dois partidos ao longo da história. E é verdade.
Com exceção de Carter, que pelo menos pautou o debate sobre a questão dos direitos humanos, o que se vê da relação dos EUA com outros países nos últimos 60 anos foi o exercício bruto do imperialismo yankee, pronto a derramar sangue de inocentes e fazer valer pela força seus interesses.
Com toda a esperança que despertou a eleição pela primeira vez de um negro para a presidência da maior potência econômica e militar do mundo, o governo Obama, tendo Hillary como secretária de Estado, apoiou golpes no Paraguai, Honduras, Ucrânia e Brasil.
Obama e Hillary patrocinaram a ação de rebeldes na Líbia que culminou com o assassinato de Kadafi, atuaram no desmoronamento da efêmera Primavera Árabe e respaldam incondicionalmente todas as atrocidades, incluindo crimes de lesa humanidade, cometidas por Israel em Gaza e na Cisjordânia.
Historicamente os republicanos implementam políticas externas iguais ou piores, repletas de agressões à soberania das nações, sabotagens econômicas, atentados contra a vida de líderes populares, nacionalistas e de esquerda, além de financiar e armar insurreições e levantes tendo como alvo governos legítimos e constitucionais.
Bush pai, na guerra do Golfo, e Bush filho, nas invasões do Afeganistão e do Iraque, são apenas dois exemplos de guerras provocadas por governos republicanos, com o objetivo de pilhar o petróleo do mundo árabe.
Mas alto lá. Em vários outros aspectos são marcantes as diferenças entre democratas e republicanos. Obama criou o Obamacare, taxando os planos de saúde privados para financiar a cobertura médica de milhões de americanos pobres. Trump promete acabar com o programa, empreitada para o qual conta com o apoio de todas as alas do Partido Republicano.
Trump defendeu abertamente durante toda a campanha a expulsão sumária dos estrangeiros ilegais e a criação de todo tipo de embaraço e restrição para que também os legais deixem o país. Os democratas, embora em um ritmo não adequado à gravidade do problema, vêm adotando políticas públicas voltadas para a integração plena dos imigrantes à sociedade.
O magnata não esconde sua aversão a hispânicos, árabes e negros, além de assumir e alardear suas convicções racistas, misóginas, homofóbicas e xenófobas. Gravações que vazaram na campanha com declarações suas sobre as mulheres revelam a pessoa execrável que vai presidir os EUA.
O Partido Democrata, a despeito de seus vínculos com Wall Street, com os falcões do Pentágono e com a indústria do petróleo, abriga o movimento negro, os hispânicos, as mulheres, os sindicalistas e os ecologistas. Por isso, não pode fugir das mediações políticas e se submete ao sistema americano de freios e contrapesos.
O presidente eleito despreza os organismos multilaterais (por ele a Organização Mundial do Comércio fecharia as portas) e quer obter superávit comercial para seu país a fórceps, nem que para isso tenha que taxar os produtos chineses em 35%, outra de suas promessas bizarras de campanha. A construção de um muro na fronteira com o México proposta por Trump seria cômica se não fosse trágica.
Como, infelizmente, tudo que acontece nos EUA tem o condão de influenciar a opinião pública e os governos de muitos países, tempos ainda mais sombrios se avizinham para os sete bilhões e trezentos milhões de habitantes do planeta terra. Quem viver verá.