O debate sobre a conveniência do voto em lista fechada vem sendo turvado pela súbita adesão de oportunistas do PMDB e do PSDB. Como estão com a imagem na lama por conta de um turbilhão de denúncias de corrupção, eles querem fazer do voto em lista um mero biombo para se esconderem do eleitor. O medo de perder o foro privilegiado diante uma provável não reeleição explica o pânico que toma conta de boa parte das bancadas de parlamentares golpistas.
Daí, como num passe de mágica, adversários históricos do voto em lista passaram a defendê-lo como a panaceia para os males, imperfeições, distorções e vícios do sistema eleitoral em vigor no Brasil. Até o tucano-togado Gilmar Meses demonstra simpatia pela ideia. Contudo, é preciso separar o joio do trigo. A atual contaminação da discussão por uma questão conjuntural, como o desespero dos corruptos em busca de uma boia de salvação, não diminui o valor estratégico do sistema de voto em lista.
Claro que a adoção da lista não teria o condão de livrar o nosso sistema eleitoral de todas as suas mazelas. Mas, contribuiria para o fortalecimento dos partidos, para o fim da briga de foice entre candidatos do mesmo partido ou coligação, para a a difusão dos programas partidários em detrimento das campanhas personalistas, para a nitidez ideológica dos atores políticos, para o resgate da golpeada e cambaleante democracia brasileira.
Os críticos desse modelo argumentam que ele aumentaria o poder de fogo dos caciques partidários, como se eles já não dessem as cartas no sistema proporcional vigente; que tiraria o direito da população de conhecer a fundo seus candidatos, como se isso fosse mais importante do que saber quais são as ideias que seu partido defende; e que soaria como uma excrescência num país sem tradição de partidos programáticos, esquecendo-se de que a lista é um instrumento precioso justamente para romper com essa realidade daninha a qualquer democracia.
Mas voto em lista sem financiamento público de campanha tornaria o sistema manco e vulnerável. As duas mudanças se completam e o sucesso de uma depende da implementação da outra. Como é forçoso reconhecer que o modelo representaria uma guinada de 180 graus na cultura política do país, vejo com bons olhos uma proposta do deputado do PT gaúcho Henrique Fontana, feita quando ele relatava um projeto de reforma política que não foi à frente na Câmara dos Deputados.
Para tentar quebrar a resistência ao voto em lista entre seus pares, Fontana propôs um modelo híbrido, através do qual o eleitor votaria duas vezes na eleição para a Câmara : no primeiro voto, escolheria a lista do partido de sua preferência; na sequência, votaria num dos candidatos dessa lista. Com isso, ao eleitor caberia ordenar a lista. A quantidade de votos na lista determinaria quantos deputados o partido elegeria, enquanto o segundo voto apontaria os eleitos desse partido.
O PT e parcela expressiva da esquerda há muito defendem o voto em lista. Abandonar a luta pela implantação de um modelo virtuoso e consolidado em várias democracias avançadas seria um desserviço ao país.