Antes que imaginem que o tórrido verão carioca queimou de vez os meus miolos, respondo com uma obviedade estelar à indagação metafórica do título deste artigo: depende, se for no mar, o tubarão, mas caso a disputa aconteça em terra, o cavalo, é claro.
Contextualizando politicamente a contenda: no que depender apenas do Congresso Nacional, não há a mais pálida esperança de que a oposição parlamentar ao governo Bolsonaro, formada por cento e poucos deputados e cerca de 20 senadores, consiga evitar um retrocesso avassalador, com o fim de direitos civis, políticos, sociais, econômicos trabalhistas, previdenciários, ambientais e civilizatórios.
A nova composição da Câmara dos Deputados e do Senado da República, que é ainda mais desqualificada, obscurantista, entreguista, corrupta e desprovida de consciência social do que a da legislatura anterior, não nos autoriza igualmente a alimentar expectativas de barrar o leilão das riquezas da nação, como defende abertamente o ministro Paulo Guedes,
Chocou a todos o circo dos horrores em que se transformou a eleição para a presidência do Senado. Inebriada pelo avanço eleitoral inegável nestes tempos de trevas, a direita e a extrema direita perderam a noção do ridículo. Com a maior naturalidade elegeram para presidir o Senado e, consequentemente, o Congresso Nacional, um senador que não reúne os predicados necessários sequer para ser síndico de condomínio de um prédio de três andares.
Embalados pela cantilena moralista bem típica dos dias atuais, segundo a qual o voto aberto para todas as votações é um avanço democrático, e fingindo desconhecer que o voto fechado em algumas questões funciona como um escudo protetor contra pressões políticas, econômicas, e de toda ordem, os senadores brindaram a sociedade com mais de 24 horas de uma baixaria de dar dó. Ali é possível cravar: mais de 50 senadores rezam na cartilha do nazi-bolsonarismo.
Na Câmara dos Deputados, a reeleição do Rodrigo Maia é a certeza de que teremos à frente da Casa um militante tenaz e obsessivo das causas do mercado financeiro e do rentismo. Foi assim durante o governo Temer e não será diferente agora.
Aos que se comoveram com as promessas vazias do candidato de respeitar as minorias e manter a independência do Legislativo, sugiro que façam um esforço mínimo de memória e lembrem como o Cesar Maia Júnior passou como um trator sobre a oposição na aprovação da reforma trabalhista, no congelamento dos gatos sociais e na quebra do regime de partilha do pré-sal. Como presidente da Câmara, Maia se pauta exclusivamente pelos interesses do capital. Ponto.
Moral da história e voltando à alegoria da corrida entre o tubarão e o cavalo: no parlamento, as forças democráticas e progressistas já perderam, porque nessa raia de disputa o povo não tem vez. Contudo, ainda temos uma chance: levar a competição para as ruas e para mobilização social. Nesse campo podemos vencer, ou pelo menos evitar derrotas maiores, se formos capazes de construir um movimento de massas que exerça forte pressão sobre os congressistas.
Sabemos das enormes dificuldades para tornar realidade este desafio, a começar pelo apoio expressivo que o presidente imbecil ainda desfruta em todos os estratos sociais.
Mas é uma espécie de obrigação política e moral dos lutadores apostar com vigor nessa alternativa. No entanto, ela só terá como prosperar se os partidos de esquerda, sindicatos e movimento sociais despertarem para formas inovadoras de luta. Não é concebível, na atual conjuntura, que a esquerda, herdeira de um patrimônio de combate pelas melhores causas da humanidade através dos tempos, adote como tática apenas as mobilizações convencionais.
As jornadas de luta contra o golpe e por Lula Livre mostraram o esgotamento do almanaque passeata-comício- casa. Tudo isso é muito importante e deve ser mantido e ampliado, mas a nossa burguesia, a mais reacionária e antidemocrática do mundo, já absorveu essas manifestações e não está nem aí para seus efeitos.4
Claro que não estou defendendo luta armada, o que seria uma total insanidade, seja pela correlação de forças na sociedade ou porque resolver os conflitos sociais e políticos pacificamente é o melhor caminho. Mas não vou aqui num texto público dar munição ao inimigo, fazendo sugestões concretas de novas formas de luta. Basta uma consulta rápida aos livros de história.