O principal ponto de pauta da reunião entre Bolsonaro e seus ministros, realizada nesta segunda-feira (6), girou em torno da construção de um acordo que pavimente o caminho para que o sonho dourado de Bolsonaro, o fim da quarentena, vire realidade
Não por acaso, ainda durante o transcurso da reunião, o Ministério da Saúde, em pleno avanço vertiginoso do número de mortos pela pandemia do coronavírus no Brasil, divulgou mais um boletim epidemiológico. Seu conteúdo põe a nu o acerto macabro costurado para garantir a permanência do ministro mais popular do governo atualmente.
Chocando-se com todos os estudos científicos e ações que deram certo em outros países, o Ministério da Saúde propõe a flexibilização da quarentena já a partir do próximo dia 13, em princípio nas cidades e estados em que o total de leitos na rede hospitalar não tenha superado os 50% de ocupação.
E, pasme, o próprio texto reconhece que, ao mudar a orientação e manter em isolamento apenas os grupos de risco (idosos e pessoas com comorbidades), esses estados e municípios terão de conviver com o aumento do número de doentes, casos graves e mortos.
Chega a ser inacreditável que autoridades da área de saúde adotem posições e procedimentos que impliquem deliberadamente no sacrifício de vidas. Médicos que honram seus diplomas, por óbvio, devem rechaçar de pronto toda e qualquer iniciativa cuja consequência seja a morte. A defesa inflexível da saúde e da vida consta inclusive do “juramento de Hipócrates” que os doutores fazem na cerimônia de formatura.
No governo da morte, no entanto, essas aberrações não só existem como são vistas com naturalidade. Trata-se de um gesto de uma irresponsabilidade criminosa dispor da vida das pessoas, jogando no lixo as orientações expressas da Organização Mundial de Saúde, de infectologistas, virologistas, pneumologistas, enfim, de toda a ciência médica,
E mais: só mesmo a necessidade de fazer valer a posição política –obtusa e genocida- de Bolsonaro pode explicar decisão tão burra como a do isolamento seletivo (repito, no justo momento em que a covid-19 se expande de forma avassaladora) em cidades e estados nos quais a quantidade de leitos não tenha atingido mais da metade da ocupação.
A explicação é óbvia: decretada a relativização da quarentena, não tardará para que um município, por exemplo, logo sature sua capacidade de absorver novos pacientes e entre em colapso, pois é certo que o aumento do contagio provocará novos casos graves e que exigem internação. Assim, prefeitos e governadores se verão forçados a redecretar o isolamento total.
Claro que Bolsonaro saiu bem menor do episódio da tentativa de demitir o ministro. Desautorizado pelo Congresso, STF e militares, teve sua autoridade arranhada e inegavelmente enfraquecida. Contudo, Mandetta também se apequenou, aceitando curvar a espinha e deixar a ciência de lado.
A pergunta que fica é: quem vai responder criminalmente por essa aposta macabra e consciente no aumento do número de mortos no Brasil? Resta a esperança de que governadores e prefeitos de bom senso e apreço pela vida rejeitem essa proposta funesta.