Bolsonaro sabe que se desenha para ele, no horizonte de 2022, uma derrota acachapante. Pudera. A despeito da sabotagem de depoentes mentirosos e cínicos, a CPI do Genocídio avança, o desemprego bate recordes, os preços dos alimentos estão pela hora da morte e a fome assola milhões de brasileiros e brasileiras.
E agora um novo e fundamental ingrediente há que ser levado em conta: a oposição de esquerda está de volta às ruas. Quem esteve no #29M pôde notar pelo brilho do olhar de esperança de cada jovem, cada mulher, cada negro, cada trabalhador que as grandes manifestações de sábado foram apenas o pontapé inicial de uma campanha cívica.
Abre parênteses: todas, repito, todas as dezenas de milhares de pessoas que compareceram ao ato do Rio usavam máscaras. A imensa maioria delas inclusive de boa qualidade. Fecha parênteses.
No Rio, embora a Polícia Militar tenha se limitado a acompanhar os manifestantes, era visível o semblante de contrariedade dos soldados diante das palavras de ordem entoadas, os cartazes e as faixas denunciando o governo criminoso de Bolsonaro.
Foi no Recife, porém, que a PM exibiu suas garras truculentas agindo como milícia da reação. A violenta repressão policial que deixou uma pessoa cega de um olho, outras feridas e não poupou nem mesmo a vereadora Liana Cime, do PT, atingida no rosto com gás de pimenta, não deve ser creditada somente ao despreparo, à falta de formação democrática e humanista, nem à vocação das polícias para reprimir o povo.
Sem tirar nem pôr: os policiais só dispararam balas de borracha, jogaram bombas de gás à granel e distribuíram porrada a torto e a direito porque o ovo da serpente do fascismo e do golpismo vêm sendo chocado em batalhões da PM espalhados por todo o país.
Nessas tropas numerosas, Bolsonaro conta com forte e decidido apoio. As pessoas, no Recife, foram agredidas pelo “crime” de protestar contra Bolsonaro. Isso é muito grave.
Muito mais do que com o “seu Exército”, Marinha e Aeronáutica, é especialmente com as PMs e sua capilaridade nacional que Bolsonaro conta para se lançar na aventura de não reconhecer a derrota na eleição presidencial de 2022.
E o roteiro inclusive já vem sendo ensaiado: questionar o resultado das urnas devido à falta de voto impresso e em seguida insuflar a PM, milicianos, policiais civis, a banda golpista das Forças Armadas e seus seguidores civis fanatizados para a ruptura da ordem constitucional.
Cabe lembrar que tramita na Câmara dos Deputados um projeto conferindo mandato fixo para comandantes da PM e subordinando-os ao presidente da República. Essa aberração constitucional tiraria dos governadores o poder sobre as polícias estaduais, o que certamente soa como música aos ouvidos de Bolsonaro e cai como uma luva para seus planos totalitários.
Pessoalmente, acho que Bolsonaro não logrará êxito nessa investida golpista, pois as instituições e a soberania popular prevalecerão. Mas é requisito essencial para a manutenção do regime democrático que estejamos atentos e vigilantes.