Não tivéssemos no Brasil uma imprensa que há muito abdicou de qualquer princípio jornalístico em nome de um nível de partidarização indecente, uma pauta óbvia para matérias de fôlego seria a absurda quantidade de delatores no processo da Lava Jato.
Salvo engano, já são 32 acusados que se transformaram em delatores. Isso não encontra paralelo em nenhum outro processo da história do direito romano e e ocidental. O que pensar de uma investigação na qual só existem os que apontam o dedo acusador ?
O meu sentimento é de vergonha de um Judiciário que se presta a um papel desses, e mais ainda de uma mídia que o incentiva e acoberta Qualquer calouro de faculdade de direito, além de leigos dotados de um mínimo de bem senso, percebem que o chamado bom direito, com base na ampla defesa e no contraditório, vem sendo violado dia sim outro também pelo juiz Moro, pelos procuradores do MP e delegados da PF que concentram as investigações de forma irregular em Curitiba.
Irregular porque os crimes imputados a quase todos os réus não foram cometidos no Paraná. Em muito boa hora o STF começou a quebrar essa centralização, em que pese o protesto de expoentes da "República do Paraná".
Merece ser aplaudida de pé a declaração recente da presidenta Dilma de que não respeita delator. Na sua cabeça de combatente contra a ditadura deve passar a repugnante e abjeta figura de Cabo Anselmo, um militante de esquerda que se converteu em dedo-duro, cujas delações resultaram em dezenas de assassinatos.
Mas não é só no mundo da disputa política e ideológica que a figura do delator causa asco. Quem julga que se beneficia com o dedo-durismo alheio não perde por esperar. O delator que trai hoje, amanhã trairá quem o convenceu a entregar os outros.
É por isso que nas rodas escolares, nas turmas da infância, adolescência e juventude, o dedo-duro é abominado e estigmatizado. Em geral, é um sujeito egoísta e com graves falhas de caráter. Cresci numa família de cinco irmãos. E, mesmo sem nunca explicitarmos um pacto ou algo parecido, as nossas travessuras jamais foram reveladas para os nossos pais.
Na Lava Jato, salta aos olhos a forma como são fechados os tais acordos de delação. Primeiro o empreiteiro, executivo ou político é preso. Em seguida, a Justiça passa a negar todos os pedidos de relaxamento de prisão. Então, sem quaisquer provas ou condenações, e muito menos sentença transitada em julgada, as prisões provisórias e preventivas são prorrogadas.
Submetido a precárias condições carcerárias, o acusado começa a fraquejar. Nesse momento aumentam as pressões para que vire um delator. Com todas as letras, os responsáveis dão o xeque-mate: se "contar o que sabe",ganha de presente uma tornozeleira eletrônica e a prisão domiciliar.
Ah, um último aviso é dado : não é qualquer delação que o livrará da tortura psicológica. É preciso incriminar gente do PT ou ligada ao governo. Também vale, e como, empresários que tenham negócios com o governo. Nem pensar em dedurar tucanos e congêneres. Isso não interessa do Judiciário.
O resto do enredo todo mundo sabe como funciona. De Curitiba as delações são vazadas seletiva e ilegalmente para a mídia mais canalha do planeta, que cumpre a sua parte. Pobre Brasil .