De mãos dadas com o monopólio da mídia, os tucanos viram na eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara dos Deputados uma oportunidade de ouro para concretizar o projeto de ruptura da ordem democrática do país.
Embora oficialmente não apoiassem Cunha na eleição para a mesa diretora da Casa, em fevereiro, os deputados do PSDB descarregaram seus votos no então candidato do PMDB, que acabou vencendo no primeiro turno.
Pouco importava a ficha corrida de Cunha, repleta de denúncias e processos, desde quando, indicado por Paulo César Farias, assumiu, no início dos anos 90, a presidência da Telerj - braço fluminense do antigo Sistema Telebrás, que acabou levado de roldão pela privataria tucana.
Quem apoiou um sujeito com o padrão moral de Cunha para a presidência de um dos poderes da República o fez de cabeça pensada. No mundo da política ou na imprensa, bem como entre cidadãos minimamente informados, o nome do deputado sempre esteve associado ao que há de pior.
Tudo isso sem falar nas suas convicções obscurantistas, as quais nunca escondeu de ninguém. Homofóbico de carteirinha, ferrenho adversário da emancipação das mulheres e de tudo que lembra direitos humanos, Cunha, ao longo de 10 meses à frente da Câmara, manteve sob fogo cerrado um sem número de conquistas sociais e direitos civis assegurados pela Constituição cidadã de 1988.
Nada disso foi suficiente para sequer arranhar sua relação com os tucanos. Ao contrário, o maior partido da oposição apoiou todas as barbaridades cometidas por Cunha, inclusive os vergonhosos golpes regimentais, através dos quais o presidente da Câmara revertia derrotas no plenário repetindo as votações.
Tudo valia a pena para adular o homem com poder para dar início ao processo de impeachment da presidenta Dilma. Nessa cavalgada golpista insana, o PSDB votou a favor da terceirização indiscriminada prevista no PL 4330, da redução da maioridade penal, da manutenção do financiamento empresarial de campanhas, do liberou geral das armas, de uma reforma política que tornou o sistema político brasileiro ainda pior e de uma penca de projetos medievais na área do comportamento.
O PSDB pode soltar nota oficial anunciando seu rompimento com Cunha, pode apontar a óbvia fragilidade de sua defesa (com base na venda de carne moída e outras agressões à inteligência alheia) e pode, cinicamente, pregar sua saída da presidência.
Mas só não pode mais é se livrar do carimbo de partido que afronta a soberania popular e que não respeita as regras do jogo democrático. Covas e Franco Montoro não mereciam que o partido fundado por eles um dia tivesse sua imagem associada ao golpismo mais infame.