Depois de quase 50 anos, a jornalista Hildegard Angel recebeu as certidões oficiais de óbito do irmão, Stuart Angel, e da mãe, a estilista Zuzu Angel. Ambos foram mortos pela ditadura na década de 1970. A procuradora responsável por emitir a declaração com as condições de morte, Eugênia Gonzaga, foi afastada da presidência da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos em agosto deste ano, por intervenção do presidente Jair Bolsonaro (PSL).
Nos documentos oficiais, emitidos na sexta-feira (06/09), consta como causa “morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada a população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985”.
“A Justiça autorizou a retificação de que Zuzu não teria morrido acidentalmente, mas em razão de perseguição política, como reconheceu a Comissão Nacional da Verdade”, havia declarado Eugênia, enquanto presidia a Comissão. No entanto, quatro dos sete integrantes do grupo foram trocados pelo presidente no começo de agosto. A justificativa de Bolsonaro para a mudança foi que agora o Brasil tem “um governo de direita”.
“O motivo que mudou o presidente, agora é o Jair Bolsonaro, de direita. Ponto final. Quando eles [governos anteriores] botavam terrorista lá, ninguém falava nada. Agora mudou o presidente. Igual mudou a questão ambiental também”, afirmou, ao sair do Palácio da Alvorada, no dia 1º de agosto.
Memória
Zuleika Angel Jones, ou apenas Zuzu Angel, foi uma das mais importantes estilistas do país, além de ter passado anos denunciando as arbitrariedades da repressão do regime. Zuzu morreu em um acidente de carro planejado pela ditadura em 1976, na saída do túnel Dois Irmãos, em São Conrado (RJ). Na época, os militares classificaram a morte como um acidente automobilístico. Segundo depoimentos, ela teria sido jogada para fora da pista por um carro pilotado por agentes da repressão.
Seu filho, Stuart Angel, era militante do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8). Foi preso no Rio de Janeiro e levado para a Base Aérea do Galeão, onde foi brutalmente torturado e não resistiu, vindo a falecer em 14 de maio de 1971, cinco anos antes de sua mãe.
A partir daquele momento, Zuzu passou a buscar informações sobre o filho e o direito de sepultá-lo, denunciando as arbitrariedades praticadas pela ditadura à imprensa e a órgãos internacionais. Ainda em 1971, realizou um desfile-protesto no consulado brasileiro em Nova York. Suas criações incorporaram elementos que denunciavam a situação, com estampas representando tanques de guerra, canhões, pássaros engaiolados, meninos aprisionados, anjos amordaçados.