Foto: André Accarini
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, participaram de uma roda de conversa, na última sexta-feira (17), em São Paulo, com representantes de movimentos populares, entre eles a CUT, cujo tema foi o Plano de Transformação Ecológica, desenvolvido pelas pastas e anunciado recentemente.
O encontro foi realizado no auditório da Faculdade Casper Líbero, na Avenida Paulista.
Dividido em seis eixos, o plano guiará a transição econômica do país. Finanças sustentáveis, economia circular, adensamento tecnológico, bioeconomia, transição energética e adaptação à mudança do clima são os pilares da inciativa.
Ambos os ministros falaram sobre a realidade não só do Brasil, mas do planeta, no que diz respeito à urgência de colocar em prática um novo modelo produtivo que reduza as emissões de gazes de efeito estufa, ou seja a emissão de CO2 na atmosfera, alertando que o planeta pede socorro imediato.
Em sua fala, Haddad chegou a citar uma percepção pessoal sobre o tema para expressar sua preocupação. “Antes eu imaginava que o aquecimento global fosse impactar nos meus netos. Depois comecei a entender que o impacto seria já com meus filhos. Agora, eu me preocupo também com a minha existência”, disse o ministro para explicar a gravidade da situação.
Vamos ter que, a um só tempo, tentar mitigar os efeitos do que já vai acontecer enquanto a gente tenta construir um mundo melhor. A gente pensava que isso só fosse acontecer de 2050 para lá. Mas não, vai acontecer de 2050 para cá- Fernando Haddad
O ministro ainda explicou os motivos de seu ministério coordenar o plano. “É um erro opor economia e ecologia, pois a mudança do clima prejudicará a produção de alimentos, a disponibilidade de empregos e a inflação, por exemplo. A sociedade não foi educada para cooperar em proveito do bem comum”, disse Haddad.
Para a ministra Marina Silva Marina, conseguir avançar na agenda de enfrentamento à emergência climática passa por, sobretudo, garantir uma política ambiental transversal. O Plano para a Transformação Ecológica, de acordo com ela, é uma estratégia pensada de maneira conjunta e interministerial.
“A política ambiental não tem como ser setorial. Se for está condenada ao fracasso”, defendeu Marina Silva.
No diálogo com os movimentos populares, a ministra ainda reconheceu a importância da participação popular. “É impossível cuidar de 8,5 milhões de km² sem a participação social (...) A dimensão do controle e da participação social é fundamental. É impossível, somente a partir do Estado, cuidar das riquezas e das belezas do Brasil, sem a participação da população”, afirmou Marina.
Participação e centro do debate
O emprego, a renda, direitos, a qualidade de vida e a sustentabilidade são pontos centrais nos debates sobre a transição de modelos produtivos e energéticos. Ao abrir a participação dos movimentos populares, após pronunciamento do secretário especial do Ministério Da Fazenda, Rafael Dubeux, Antônio Lisboa, secretário de Relações Internacionais da CUT, reforçou o posicionamento da central em relação ao tema.
“Queremos que a transição e modelo produtivo, de forma “limpa”, não seja feita nas costas dos trabalhadores, em especial das populações mais carentes do sul do mundo. A transição tem que ser centrada na classe trabalhadora”, afirmou o dirigente se referindo não somente ao Brasil, mas também a outros países do hemisfério sul do planeta, como os países africanos, a Índia, entre outros.
“Temos que entender que as necessidades do sul do mundo não são as mesmas do norte. Por isso, é preciso consultar as populações e garantir que esses trabalhadores não sejam abandonados e não tenham direitos”, pontuou Lisboa.
Outro ponto abordado pelo dirigente para reafirmar a classe trabalhadora como elemento fundamental na transição de modelo foi o de que trabalhadores que no atual modelo sequer tem acesso aos benefícios gerados por tal modelo. Ou seja, são inúmeros os casos de populações, em geral mais carentes, que sofrem com os impactos ambientais e econômicos de grandes obras e não usufruem dessa produção que fica restrita às classes econômicas dominantes.
E, no caso de uma transição para um modelo, como ele citou “entre aspas justo”, a classe trabalhadora não pode ser penalizada, seja ela a que está nos empregos formais em grandes conglomerados, seja ela a que está nos locais mais distantes dos centros econômicos do país.
Citou ainda que em vários países a classe trabalhadora tem sido deixada de lado nos debates e esse é um grande desafio para o Brasil em seu plano de transição ecológica.
Ainda para o dirigente, a abertura de diálogo com o governo sobre o plano é algo positivo. “Chegamos em um momento em que há diálogo com ministros e isso já nos anima muito”, disse Lisboa.
O secretário de Meio Ambiente da CUT, Daniel Gaio, reforça que, para a Central, Transição Ecológica só será possível se houver o participação da classe trabalhadora.
"Por isso, reivindicamos uma transição justa, envolvendo os trabalhadores que serão afetados e atuam nos empreendimentos de transição energética, assim como as comunidades dos territórios. O ministério do Trabalho e Emprego também participar do Plano de Transição Ecológica que nos foi apresentado".
Ele afirma ainda que a CUT reivindica e fica satisfeita que o governo esteja conduzindo a Transição Energética e Ecológica no Brasil. "Entendemos que energia e os recursos naturais são bens comuns e não mercadoria. Nesse sentido, é que as empresas públicas têm papel fundamental em garantir tecnologia e democratização e universalização do acesso à energia, e por isso que a reestatização da Eletrobrás também é uma pauta da CUT".
O dirigente ainda pontua que os movimentos popualres estão em alerta diante de empreendimentos de energia eólica e placas solares no Norte e Nordeste implementados por empresas que não estão preocupadas em garantir os direitos e segurança aos trabalhadores. "Nesses locais, observamos a precarização do trabalho e desrespeito às comunidades".
Plano
Considerado um marco na política ambiental e econômica do país, visa promover um futuro mais sustentável. No diálogo com os movimentos populares, Haddad enfatizou a importância de integrar sustentabilidade e inovação nas políticas econômicas, enquanto Marina destacou a urgência de ações climáticas e a necessidade de uma transição energética responsável.
Ambos ressaltaram a relevância do engajamento de diferentes setores da sociedade nesse processo.
De acordo com Rafael Dubeux, o plano, apesar de já apresentado, continua em construção e encontros com a sociedade civil são fundamentais. Para ele, as contribuições vão ajudar a responder, de maneira precisa, os problemas emergentes ocasionados especialmente pelo aumento da temperatura na Terra e pela alta na emissão de gases do efeito estufa, especialmente aqueles vindos da queima de combustíveis fósseis.
“O plano está longe de estar acabado. Estamos absolutamente abertos para complementar e este dialogo é absolutamente fundamental”, afirmou Dubeux.
Movimentos populares
Diversas representações participaram do evento. Entre os movimentos, a União Nacional dos Estudantes (UNE), a Marcha Mundial das Mulheres (MMM), a Central de Movimentos Populares (CMP), a Coalizão Negra por Direitos, além de movimentos de indígenas populações ribeirinhas e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) que destacou os impactos das mudanças climáticas nas populações periféricas de cidades em eventos climáticos extremos como enchentes e tempestades.
A ministra Marina Silva, sobre esse aspecto, citou, em sua fala o exemplo do litoral norte de São Paulo, no início de 2023, quando as fortes chuvas causaram vários deslizamentos de terra. Ela afirmou que os moradores atingidos foram justamente os periféricos, que moram próximos às encostas e que perderam tudo ou quase tudo que tinham
Transição justa é prioridade para a CUT
O tema da transição justa fez parte dos debates do 14º Congresso Nacional da CUT (CONCUT) realizado de 19 a 22 de outubro, também em São Paulo. A transição produtiva e energética foi contemplada no eixo “Intervenção da CUT na reconstrução do desenvolvimento econômico sustentável e combate à desigualdade”.
Antecedendo o CONCUT, a Central realizou, em parceria com outras organizações, o III Fórum Sindical Internacional por uma Transição Social e Ecológica, que recebeu líderes sindicais de diversos países para debates sobre a transformação do sistema energético, as transições setoriais, as estratégias de fortalecimento dos trabalhadores na construção das relações de poder; a crise do capitalismo e da democracia, a ascensão do autoritarismo, a extrema-direita e a crise climática.
Também foram debatidos a segurança alimentar e o direito à terra como direito humano.