Caso os Jogos Olímpicos de Tóquio ocorram dentro da data prevista pelo Comitê Olímpico Internacional, em 24 de julho de 2021, a judoca Rafaela Silva, única brasileira campeã mundial (2013) e olímpica (2016) na modalidade, está fora da competição. Após testar positivo no exame de doping realizado em agosto de 2019, no Pan de Lima, a atleta recebeu em janeiro deste ano punição de dois anos, contando a partir da data do teste, pela Federação Internacional de Judô (FIJ). Ela e sua assessoria jurídica recorreram da decisão, sem sucesso. Nesta terça-feira, a Corte Arbitral do Esporte (CAS), na Suíça, última instância do direito desportivo mundial, negou o recurso apresentado pelo novo advogado de Rafaela, Marcelo Franklin, reconhecido por ganhar causas a favor de outros atletas brasileiros em casos de doping, e manteve a punição de dois anos.
A substância encontrada no teste de Rafaela foi o fenoterol. Com efeito broncodilatador comumente utilizado em tratamento de doenças respiratórias, o composto é especificado na Agência Mundial Antidoping (Wada) como proibido para a prática esportiva profissional, pois causa aumente de performance ao melhorar a troca gasosa entre o sangue e o pulmão. A mesma substância foi detectada no organismo da nadadora Etiene Medeiros, em junho de 2016. Na ocasião, a nadadora acabou sendo inocentada.
O ex-advogado de Rafaela, Bichara Neto, e seu ex-bioquímico, L. C. Cameron, argumentaram que a judoca ingeriu a substância proibida ao dar seu nariz para um bebê chupar. Lara, de sete meses, é filha de Flávia Rodrigues, judoca do Instituto Reação – que revelou Rafaela. A criança estaria fazendo uso de medicação contra asma, e o contato entre Rafaela e Lara teria acontecido em 4 de agosto, na véspera do embarque para Lima.
A tese não convenceu a FIJ, que aplicou pena de 24 meses, gerando a perda da medalha de ouro no próprio Pan de Lima, além das medalhas de bronze (individual e por equipes) conquistadas por Rafaela no mundial do Japão, ambos em 2019.
Durante o mundial, no final de agosto do ano passado, pouco após o Pan, Rafaela soube de rumores a respeito da provável detecção da substância dopante e fez um novo teste de doping, que deu negativo. Em seguida, em outubro, decidiu se afastar voluntariamente dos tatames.
Em 24 de janeiro, nove dias após ser punida, Rafaela anunciou a troca de sua defesa. “Decidi que doravante minha defesa no caso de doping ficará a cargo da Franklin Advogados Associados”, declarou em nota oficial. Marcelo Franklin é conhecido mundialmente como referência em causas ganhas a favor de atletas que recorreram a decisões antidopagem. O caso mais famoso foi do nadador César Cielo, que em 2011 foi absolvido pela mesma CAS que ratificou a decisão contrária a Rafaela Silva.
Franklin apresentou ‘novos cenários para a contaminação’. Em nota distribuída hoje à imprensa, a CAS disse que a nova defesa de Rafaela pediu uma sanção mínima ou advertência porque ela teria sido “acidentalmente contaminada com a substância proibida pelo contato com sua colega de quarto ou com torcedores durante os Jogos Pan-Americanos”.
“O Painel da CAS responsável não conseguiu concluir que Rafaela Silva havia se livrado da responsabilidade que cabe a ela no equilíbrio de probabilidades da ‘rota da ingestão’ de uma substância proibida. Consequentemente, o Painel não foi capaz de reduzir ou eliminar a sanção imposta a ela na decisão contestada”, explicou a corte.
A Confederação Brasileira de Judô (CBJ) diz lamentar os efeitos da decisão proferida pela CAS e classifica Rafaela como ‘uma das maiores atletas do país’. “Uma das principais lições que o nosso esporte ensina é aprender a cair, levantar e seguir”, declara em nota. O presidente do Comitê Olímpico do Brasil, Jorge Bichara, também lamentou a decisão e disse que Rafaela “sempre foi uma atleta exemplar”.
Flavio Canto, fundador do Instituto Reação e considerado mentor da medalhista olímpica, publicou em sua conta no Instagram: “Que tenha força necessária para superar esse dia triste, vestir seu quimono e voltar para o seu lugar”.
A esposa de Rafaela, a também judoca Eleudis Valentim, definiu a decisão como ‘injusta’. “Hoje uma injustiça foi feita pelas mãos do homem, mas Deus sabe de toda a verdade e vai nos dar forças para voltarmos mais forte”, publicou em seu perfil no Instagram.
A coluna procurou Silvio Acácio Borges, presidente da CBJ, mas a assessoria informou que a confederação só se manifestaria por meio da nota oficial. Rafaela Silva também não se manifestou a respeito da decisão final da CAS.