A família do presidente norte-americano, Donald Trump, está lutando uma batalha legal para que não seja publicado o livro Too much and never enough: how my family created the world’s most dangerous man (Demais e nunca o suficiente: como minha família criou o homem mais perigoso do mundo). É assinado pela sobrinha do mandatário, Mary Trump, de 55 anos. Doutorada em psicologia clínica, Mary é filha de Fred Trump Jr., o irmão mais velho do presidente, que morreu em 1981 após complicações cardíacas causadas pelo alcoolismo. “Donald, seguindo o exemplo de meu avô e com a cumplicidade, o silêncio e a inação de seus irmãos, destruiu meu pai. Não posso deixar que destrua meu país”, afirma a autora em um livro que causou tanta expectativa que a editora adiantou em duas semanas sua publicação. Deve sair em 14 de julho. Veículos de imprensa norte-americanos como a CNN e o The Washington Post tiveram acesso ao texto na terça-feira.
Donald Trump e seus irmãos foram vítimas de um pai dominante e frio, Fred Trump, a quem tentaram conquistar através de mentiras durante toda a sua vida, como narra Mary Trump. O livro esclarece que para seu falecido pai “mentir era defensivo, não simplesmente uma forma de evitar a desaprovação de seu pai e evitar o castigo, como foi para os outros, e sim uma forma de sobreviver”. A sobrinha do presidente norte-americano conta que este pagou a alguém para que fizesse o SAT (o equivalente ao ENEM dos EUA), que por fim lhe valeu a entrada na prestigiosa Wharton School da Universidade da Pensilvânia. Trump estava preocupado porque sua média de notas, longe dos primeiros da classe, seria uma dificuldade para ser aceito.
“Mentir era principalmente um modo de autoengrandecimento destinado a convencer outras pessoas de que ele era melhor do que realmente era”, escreve Mary Trump sobre seu tio, de 74 anos. Acrescenta que esse padrão foi visto ao longo de toda sua carreira profissional, como quando se apresentou à indústria imobiliária de Nova York como um self made man e um grande negociador. “Seu conforto ao retratar essa imagem, junto com o favor de seu pai e a segurança financeira que a riqueza deste lhe dava, lhe deram a confiança imerecida para o que foi uma farsa desde o começo: vender-se não só como um playboy rico, e sim como um brilhante empresário que subiu na vida sozinho”, diz o livro. De acordo com a imprensa local, Mary Trump se apoia em documentos legais, extratos bancários, declarações de impostos e outros papéis para sustentar suas recordações.
Enquanto viam pela televisão a entrada de Trump na campanha pelo Partido Republicano, em 2015, a irmã mais velha deste, a ex-juíza federal Maryanne Trump Barry, ironizou o candidato. Ela o chamou de “palhaço” e afirmou que nunca seria presidente. Além disso, mostrou sua decepção a Mary Trump pelo fato de Trump usar o vício de Fred Jr. com finalidades eleitorais. Maryanne Trump Barry se aposentou em abril de 2019, colocando fim a uma investigação contra ela sobre se havia violado as normas de conduta judicial ao participar de uma trama fiscal suspeita com seus irmãos. Os conflitos familiares multigeracionais são a principal parte do livro, que tenta explicar os “comportamentos perversos” de Trump, como enxergar outras pessoas em “termos monetários” e “criar trapaças como uma forma de vida”.
Quando o pai de Donald Trump morreu, em 1999, Mary e seu irmão Fred não receberam a herança que esperavam, isto é, uma soma igual à quantidade que seu pai teria recebido se estivesse vivo. De modo que os dois impugnaram o testamento argumentando que alguém conectado à família Trump havia obrigado seu avô a mudá-lo e deixar-lhes menos dinheiro. Por fim, chegaram a um acordo com seus tios e receberam uma quantidade não revelada. Isso, após assinar um acordo de confidencialidade em se comprometiam a nunca escrever sobre algum membro da família se todos não estivessem de acordo.
Robert Trump, o irmão mais novo do presidente norte-americano, apresentou em maio uma ação contra sua sobrinha Mary e contra a editora Simon & Schuster no Supremo Tribunal do Estado de Nova York, alegando uma violação desse acordo assinado há duas décadas. Ganhou o caso e bloqueou temporariamente a publicação. Um tribunal de apelações revogou no dia seguinte a ordem de restrição contra a editora porque esta não havia assinado nenhum acordo de confidencialidade. Mas a ordem que compromete a autora continua vigente, de modo que não pode fazer nenhum comentário público. Seu porta-voz, Chris Bastardi, afirmou na segunda-feira: “A ação de um presidente em exercício para silenciar um cidadão privado é somente a última de série de condutas inquietantes”.