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Futuro político da Bolívia pode estar nas mãos de eleitores do exterior

Out 16, 2020

Por Frederico Rivas Molina, no El País                                                                                            

 

Stringer/Reuters

Mais de 300.000 bolivianos estão aptos para votar neste domingo do exterior. O peso eleitoral dessa diáspora é enorme. Só na Argentina eles representam 2,2% do censo eleitoral nacional, com 161.000 pessoas. Nas eleições presidenciais do ano passado, o ex-presidente Evo Morales obteve 82% dos votos daquele país. Se as eleições deste domingo forem tão acirradas quanto as pesquisas antecipam, pode depender do voto do exterior que Luis Arce, o homem de Morales para colocar o MAS (Movimento para o Socialismo) outra vez no Palácio Quemado, vença no primeiro turno.
 
De acordo com o censo nacional de 2010, o último disponível, 345.000 bolivianos vivem na Argentina, um número só ultrapassado pela diáspora paraguaia. As organizações, no entanto, lidam com números muito mais altos. “Somos entre dois e três milhões”, diz Leandro Ruiz Iriarte, da Cooperativa 8 de Octubre de Ezeiza, nos arredores de Buenos Aires. Ruiz Iriarte nasceu na Argentina há 33 anos, de pais bolivianos que emigraram na década de setenta. No domingo votará em Luis Arce e passou as últimas semanas muito ocupado.

“A votação na Argentina supera a de departamentos bolivianos como Beni e Pando e pode definir a eleição”, diz Ruiz Iriarte. Por isso acredita que existe uma campanha de “desmobilização do voto orquestrada em La Paz. “Só na quarta-feira o órgão eleitoral informou sobre os locais de votação. Desapareceram escolas de votação em relação ao ano passado e outras foram desdobradas. As pessoas não sabem onde votarão, porque o aplicativo está desatualizado e ainda te manda para as escolas antigas. Além disso, em setembro, elevaram de 119 para mais de 50.000 os não aptos a votar no exterior. Cerca de 25.000 estão na Argentina. A mudança de locais e a falta de informação reduzirão a participação”, afirma.

A comunidade boliviana na Argentina não perdeu os laços com seu país. E a grande maioria é fiel ao ex-presidente Evo Morales. “Tem a ver com o perfil de quem emigrou, que é semelhante ao dos que votam no MAS na Bolívia”, resume o historiador Pablo Stefanoni. Félix Lamas mora em La Plata, capital da província de Buenos Aires. Como chefe de um local de votação pelo MAS, no domingo ele supervisionará o trabalho dos delegados do partido que cuidarão do resultado “como se marca o Maradona”.

“Na Argentina há cerca de 5% de adversários do MAS”, diz Lamas. Diego Rodas é um deles. Tem 28 anos e está em Buenos Aires desde 2010, onde se formou em Direito em uma universidade particular. Sua primeira votação foi em 2014, quando optou pela oposição a Evo Morales. No domingo, colocará na urna a cédula de Carlos Mesa, que está em segundo lugar nas pesquisas. “A Argentina é um lugar superimportante”, diz, “mas me dá a impressão que os candidatos que não são do MAS não lhe deram importância porque sabem que [a eleição] está perdida”.

Rodas diz que o MAS tem a vitória garantida na Argentina porque “a comunidade viu resultados no passado”. “Mas acredito que o milagre econômico, como se diz, também tem que ser visto em uma evolução institucional e no fato de não haver mais bolivianos de primeira e segunda. Isso não aconteceu”, sentencia. Poucos bolivianos residentes na Argentina pensam como ele. Felix Lamas conta que “nos bairros periféricos, nas chácaras, ninguém é de outro partido que não o MAS. Quem conversa com um conterrâneo, a primeira coisa que lhe diz é ‘quando vamos ver Evo’”. E Evo sabe disso.

Durante uma palestra em seu exílio em Buenos Aires com lideranças sociais, à qual o EL PAÍS foi convidado, pediu a seus compatriotas que se mobilizassem. “Eu disse aos meus irmãos na Argentina em 2019: vocês decidem o futuro da Bolívia. Eles se abraçaram de alegria, cantaram. E o que fazemos agora, vamos pedir ao [ex-presidente Mauricio] Macri que nos empreste a Bombonera, ele não vai nos emprestar, vamos pedir ao papa Francisco o campo do San Lorenzo para fazer um comício. Mas a pandemia fechou tudo”, lamentou.

Governo de Alberto Fernández autorizou a abertura de 114 escolas, fechadas desde março por conta da quarentena contra a covid-19, para o voto dos bolivianos. Também abriu temporariamente as fronteiras para a entrada e saída do pessoal eleitoral e dos observadores internacionais. Josefina Barriga é presidenta da Nueva Comunidad Boliviana, associação que reúne parte de seus compatriotas em Salta, província fronteiriça com a Bolívia. Ela nasceu em Potosí há 63 anos e está na Argentina há 33. Deixou parte da família em Yacuiba, Tarija, e ainda se lembra dos tempos em que cruzava a fronteira para votar. “Era uma forma de nos reencontrarmos e passarmos um momento lá. Muitos iam votar para estar com a família”, diz. Neste domingo ela também votará, mas em Salta, e escolherá o MAS. “As pessoas estão ansiosas para que a Bolívia mude, para que as pessoas não sofram, já estamos acostumados com a forma como progredia”, diz. Este ano não houve grandes comícios dos candidatos bolivianos, como no passado, mas o MAS está confiante na diferença que fará com o voto na Argentina.

 

 

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