Refugiados atravessam a fronteira entre Grécia e Macedônia em direção ao centro da Europa (29 de agosto) (Foto: EFE)
Guerra, prisões arbitrárias, torturas, violência sexual, repressão... Pelo menos seis em cada dez pessoas que chegaram à Europa pelo mar Mediterrâneo nos primeiros oito meses de 2015 vêm de países em que as violações de direitos humanos são constantes. Na Síria, milhares de pessoas estão presas, sequestradas ou desaparecidas e cerca de 250 mil civis vivem em estado de sítio. O conflito no Afeganistão deixou 4.853 vítimas mortais no primeiro semestre de 2014. Na Eritreia, as liberdades de expressão, associação e religião não são respeitadas.
Este ano, 43% das pessoas que chegaram aos países europeus através do Mediterrâneo vieram da Síria, a maioria delas passando pela Grécia. Outros 12% vêm do Afeganistão, também pela Grécia. Da Eritreia vêm 10% delas, que chegam principalmente à Itália. As seguintes nacionalidades majoritárias são Nigéria (5%) e Somália (3%), que também chegam sobretudo às costas italianas.
Síria: um conflito com mais de 200 mil mortos
A Síria está há quatro anos mergulhada em um conflito em que já morreram cerca de 200 mil pessoas, segundo dados da Anistia Internacional (AI). Cerca de 11,6 milhões delas tiveram que abandonar suas casas, das quais quatro milhões fugiram para outros países, enquanto o resto se espalhou pela Síria. Estes quatro milhões de refugiados estão em sua maioria nos vizinhos Turquia, Líbano, Iraque e Egito.
Uma das pessoas que fugiram da Síria é Rami, 27 anos, que conta que escapou de Raqqa quando a cidade foi tomada pelo grupo extremista Estado Islâmico. “Se eu tivesse ficado, sem dúvida teriam me matado, sem fazer perguntas. O pior é que meus próprios primos também foram atrás de mim. Quase todos eles tinham aderido ao Estado Islâmico. Quase todo mundo em Raqqa tinha passado para o lado do EI, por isso são tão fortes e não havia ninguém que pudesse me dar proteção”, conta.
Além disso, milhares de pessoas estão presas, sequestradas ou desaparecidas e são vítimas de torturas e maus tratos, e cerca de 250 mil civis vivem em estado de sítio e carecem de alimentos, medicamentos e combustível. Esta situação afeta gravemente a infância: 5,6 milhões de crianças sofrem na Síria situações extremas de pobreza, deslocamento e estado de sítio, de acordo com dados da Unicef.
Afeganistão: Talibã segue controlando parte do país
Ainda que a OTAN tenha encerrado a missão no Afeganistão no fim de 2014, a situação no país está longe de ser estável. Nos primeiros seis meses do ano passado, 4.853 pessoas morreram no conflito no país, uma cifra que duplicou desde 2009, segundo um informe da Anistia Internacional. O grupo extremista Talibã segue controlando boa parte do país, onde são frequentes detenções arbitrárias em que se nega aos suspeitos o direito ao processo devido. A Anistia também denuncia violações da liberdade de expressão e aplicações da pena de morte em julgamentos sem garantias.
Segundo a ONU, oito em cada dez mulheres afegãs já sofreram violência psicológica, física ou sexual. A artista Kubra Khademi é uma delas: ao realizar uma performance nas ruas de Kabul em março desse ano, ela teve que acelerar o passo e entrar rapidamente dentro do carro de um amigo, porque sua ação incendiou os transeuntes, que a insultaram, ameaçaram e agrediram fisicamente, inclusive saltando em cima do carro que a resgatou.
Eritreia: serviço militar obrigatório por tempo indefinido
O Informe Mundial 2015 da organização Human Rights Watch (HRW) qualifica a situação dos direitos humanos na Eritreia de “deplorável”. A ONG denuncia que as detenções arbitrárias são “a norma”: os presos nem sempre conhecem as razões de sua prisão, ficam detidos por tempo indefinido e poucos ou nenhum deles são julgados. Tampouco se respeitam outros direitos humanos básicos como as liberdades de expressão, associação e religião: “Desde 2001, o governo controla com firmeza o acesso à informação e não permite o trabalho de publicações independentes, sindicatos e ONGs”, afirma o informe, que também indica que o governo “acossa” os cidadãos de religiões que não as quatro reconhecidas no país (o islamismo sunita e o cristianismo ortodoxo, católico e luterano).
Outra razão que motiva as pessoas a fugir do país é o serviço militar obrigatório. Ainda que oficialmente dure 18 meses, na prática ele tem uma duração indefinida, que frequentemente se estende a mais de uma década. “O serviço militar não tem fim, é para toda a vida”, afirma um refugiado eritreu de 14 anos de idade, cujo testemunho figura no informe da HRW. Além disso, o serviço militar obrigatório é utilizado como fonte de trabalhos forçados para o Estado.
Nigéria: o medo de ser sequestrado ou assassinado
A Nigéria também tem problemas graves com relação aos direitos humanos. “Mulheres, homens e crianças vivem sob o constante temor de serem sequestrados e assassinados pelo Boko Haram e de serem submetidos a detenção arbitrária, tortura e inclusive a morte nas mãos do Exército”, afirma a Anistia Internacional. Sete em cada dez pessoas presas no país não foram declarados culpados de nenhum delito.
A estes problemas se somam os ocasionados pela pobreza e desigualdade. Segundo a Anistia, “uma em cada três pessoas na Nigéria vive em favelas ou assentamentos informais em condições de pobreza e superlotação, com acesso limitado a água potável e sob a ameaça constante de remoção forçada”.
Somália: uma guerra que já dura 24 anos
Na Somália está em andamento um conflito armado que já dura 24 anos e que “segue deslocando, ferindo e matando civis”, diz o Informe Mundial 2015 da HRW. As forças de segurança do país são responsáveis por ataques indiscriminados, violência sexual e detenções arbitrárias.
A justiça é administrada em grande medida pela jurisdição militar, com procedimentos que não correspondem aos padrões internacionais de julgamento justo. O grupo terrorista Al Shabab recruta crianças e ataca escolas, e a ONU também já documentou casos de recrutamento infantil por parte das forças do governo.