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Guru de Castilho: "Agora estamos mais com o mercado"

Jun 17, 2021

Por El País                                                                                                                              

 

Pedro Castillo provocou inquietação na elite econômica do Peru. O candidato de esquerda populista, que obteve o maior número de votos nas eleições no último domingo e está à espera que o tribunal eleitoral resolva as anulações de mesas pedidas por sua adversária, Keiko Fujimori, não fala facilmente ao telefone. Os grandes empresários do país, acostumados a ter linha direta com o poder, de repente se viram com um possível presidente de quem nada sabem e que não é fácil de contatar. Não o encontraram em nenhum fórum de empreendedorismo. Para preencher essa lacuna, surgiu a figura de Pedro Francke, um economista e professor universitário de 60 anos, com crédito nos círculos empresariais.

Francke se juntou a Castillo como consultor econômico depois da aliança do professor rural com Verónika Mendoza, uma política de esquerda mais centrada e com uma visão mais urbana. Com isso, queria atrair a classe média que podia se sentir intimidada com propostas semelhantes às de outros países latino-americanos governados por dirigentes autoritários. Francke foi funcionário de alto nível dos governos dos ex-presidentes Alejandro Toledo e Ollanta Humala. Conhece os mecanismos do poder. Desde sua chegada, o candidato suavizou muitas de suas propostas iniciais. “Não haverá estatizações, expropriações nem controle de preços. Nos colocamos um pouco mais a favor do mercado”, explica o assessor na cozinha de sua casa, onde preparou um descafeinado em uma velha cafeteira elétrica. Acompanha com um sorvete de stracciatella.

Isso matiza aquele Castillo em cima do estrado durante a campanha. Era praticamente desconhecido em janeiro, quando percorreu todo o Peru com uma mensagem anti-establishment. Atacava com frequência o investimento estrangeiro em seus comícios e chamava a proteger o mercado nacional por meio do aumento de tarifas. As mineradoras, segundo ele, estavam com os dias contados. Sua riqueza não beneficia os pobres, dizia Castillo. Essas mensagens contra o livre mercado alarmaram o empresariado, que apoiou Fujimori em massa. Entre eles estavam alguns antifujimoristas que consideravam a eleição de Keiko um mal menor. Francke acredita que aquele Castillo era alguém em busca de atenção: “Disse tudo isso quando não tinha uma candidatura muito forte”.

O professor de escola rural chegou até aqui, às portas do Palácio do Governo, de mãos dadas com um partido que se declara marxista-leninista, o Peru Livre. Com Francke, essa revisão de contratos das transnacionais ou hipotéticas nacionalizações se tornaram um novo imposto sobre os lucros das mineradoras. Algo que o presidente Humala quis fazer e os empresários rejeitaram. Ele acredita que agora o momento é diferente. “A diferença é que o preço do cobre, nossa principal exportação, está muito alto e os analistas internacionais dizem que isso vai durar. Não é coisa do ano, há razões como o crescimento da China, a política de Joe Biden (presidente dos Estados Unidos) e uma forte mudança tecnológica devido à alta demanda por cobre para eletricidade. Calculo que as empresas, apenas em cobre, tenham uma receita adicional de 9 bilhões. Então o Peru pode dizer: ‘compartilhe um pouco mais’ “.

Vê o empresariado aberto a essa negociação. Por exemplo, Roque Benavides, um dos grandes empresários da mineração do país. “Ele declarou publicamente que sim, que de fato é preciso entender as condições. Pode-se negociar. Estão ficando com 5 bilhões a mais do que tinham pensado”, acrescenta. E esclarece: “Isso é taxá-los. mas no sentido de tirar-lhes a propriedade, não”.

Em seu primeiro debate com outros candidatos, Castillo começou dizendo que proporia a redação de uma nova Constituição. Isso implica um longo processo de obter maioria no Congresso –pouco provável–, convocar um referendo e convocar uma Assembleia Constituinte. O que quer dizer exatamente quando afirma que o Governo deve ter mais poder sobre a economia? “A Constituição atual”, explica Francke, “tem algumas travas que dificultam tomar algumas medidas. Diz que o investimento estrangeiro tem os mesmos direitos que o investimento nacional. Nenhuma constituição do continente americano tem um artigo como esse”.

Ou seja, o guru econômico de Castillo acredita que o texto tem um viés ideológico. “Assim é. Se a esquerda ganha, que possa aplicar políticas de esquerda. Com alguns limites, é claro. Como, por exemplo, a autonomia do banco central de reservas. Sim, isso deve ser mantido porque é o equilíbrio de poderes, mas também porque é o manejo global das instituições da economia. Mas com estas outras coisas, não entendo por que é positivo que uma Constituição diga que investimento estrangeiro tem que ser igual ao nacional”, defende.

O dólar atingiu sua maior cotação no Peru depois da vitória de Castillo. Agora parece ter se estabilizado. A visibilidade de Francke foi fundamental para isso. O economista diz que o salário mínimo não será alterado pelo mau momento financeiro que as empresas vivem com a pandemia. O sistema de previdência privada não será eliminado, como Castillo havia insinuado, fazendo alguns trabalhadores temerem o futuro de suas poupanças. Mas tentará reformar porque considera que a atual é ineficiente. Sobre a aplicação de tarifas a certos produtos é algo que não descarta, como no caso da batata. É raro o comício em que Castillo não se refira ao fato de que as batatas dos produtores peruanos estavam apodrecendo porque não podiam lhes dar saída. “Deveria haver um limite razoável. Não voltaríamos aos anos setenta, quando a tarifa era de 70%, por causa dos tratados internacionais que temos e porque não é conveniente (...). Mas importamos 30.000 toneladas de batatas congeladas. O Peru com um pouco de esforço poderia produzi-las ele mesmo”.

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