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'Estou estocando comida', diz estudante do ES

Fev 08, 2017

Por DCM                                                                                   

 

O cenário é de guerra. Tiroteios tomam conta das ruas que mais parecem fazer parte de cidades fantasmas. Lojas são saqueadas à luz do dia. Cidadãos que se arriscam a sair de casa são assaltados em pontos de ônibus. Cenas que poderiam ser de filmes de terror, mas que descrevem a rotina no estado do Espírito Santo nos últimos quatro dias, depois de protestos de familiares de policiais militares estourarem na sexta-feira (3) e a paralisação da categoria ter início no sábado (4). Apesar de a Secretaria de Segurança Pública ter condenado o ato dos grevistas, e a Justiça ter determinado uma multa de R$ 100 mil caso a PM não retorne os trabalhos, nada mudou até agora.

Policiais militares pedem pelos reajustes dos salários, que não acontecem há sete anos. O governo não parece querer atender à demanda e, nesse ínterim, ao menos 75 pessoas morreram. O número é tão alarmante que, se comparado ao mês de janeiro, pode ilustrar ainda mais o cenário de guerra descrito pela população do Espírito Santo : apenas quatro pessoas foram mortas na Grande Vitória – região que agrega sete municípios – no mês anterior – contra as dezenas vistas em apenas alguns dias de fevereiro.

Com tamanha demanda, o Departamento Médico Legal (DML) precisa atender de maneira improvisada. Na internet, as pessoas chegaram a afirmar que tinham fechado as portas, porém a informação de funcionários do local é de que o DML está recebendo, sim, o recolhimento dos corpos – encaminhados pela Polícia Civil.

A violência é tamanha que o governo do Espírito Santo precisou pedir auxílio da Força Nacional. Nesta segunda-feira (6), o Ministro da Defesa Raul Jungman e o governador em exercício, César Colnago, anunciaram que 200 militares do Exército Brasileiro já estavam nas ruas da Região Metropolitana de Vitória para reforçar a segurança. Vale lembrar que, além da força-tarefa, homens da Guarda Municipal também atendem às demandas antes realizadas pela PM.

“Desde sábado, nossa rotina mudou, já que realizamos as tarefas antes atendidas pela Polícia Militar. Tem sido exaustivo, inclusive acima do que podemos atender, mas a Guarda Municipal tomou a decisão de dar esse suporte à população. Achamos importante. Normalmente, nossos turnos são matutinos, vespertinos e noturnos, mas esses dias muitos guardas estão dobrando o serviço”, explica o funcionário da Guarda, Gabriel Duprat Bessa Leite, de 23 anos.

Expectativas para futuro (próximo)

As incertezas sobre a situação do estado parecem não ter um ponto final. Até a noite desta terça-feira, não existe a menor perspectiva de que a Polícia Militar volte a trabalhar. Assim, o remanejamento dos homens da Força Nacional nas cidades é realizado pelo governo do estado, conforme seja necessário.

“Nossa expectativa é que a situação se estabilize aos poucos com o trabalho conjunto entre Força Nacional, Exército e Guarda Municipal. Mas, acredito que a situação não se estabilizará se a PM não voltar às ruas. A não ser que haja o envio de mais soldados, mas mesmo assim acho difícil”, afirma o guarda municipal.

 

Mesmo com o reforço na segurança, a população ainda sente medo: afinal, arrastões, assaltos e tiroteios ainda são presenciados aos montes pelas cidades.  “Está um caos. Sinto que o medo é geral, apesar de ter melhorado com a chegada da Força Nacional na madrugada de hoje. Mas ainda nos sentimos inseguros porque não sabemos o que acontecerá nos próximos dias”, descreve L.B, estudante de Direito em Vila Velha, de 20 anos, que não quis ser identificada.

“Como os supermercados abriram as portas nesta terça, muita gente foi correndo para fazer um estoque em casa. Não sabemos como serão os próximos dias”, pontua.  “As ruas estavam vazias, parecia uma cidade fantasma. Só havia bandidos nas ruas”, conta. “Quando os carros do Exército chegaram, ao passar pelas ruas, as pessoas aplaudiam. Apesar disso, ainda acho que não é o suficiente para controlar o caos que vivemos”, finalizou a estudante.

E se a situação vivida pelos moradores de cidades maiores, como Vitória e Vila Velha, é de tensão, em cidades interioranas, onde a força-tarefa ainda não chegou, é ainda pior. Como define a estudante de odontologia Karoline Rodrigues, de 19 anos, moradora de Coqueral, “não existe a quem recorrer”. Ela é filha de policiais militares, que estão de férias no momento.

“Estamos acompanhando as notícias, sabemos de muitas famílias que estão protestando em frente aos batalhões pelas melhores condições de trabalho, que é bastante arriscado. E o governo faz descaso. Porém, também vemos muitas pessoas se voltando contra a PM por causa do medo e do nervosismo dos últimos dias. No fim, todos somos reféns da violência”, diz.

Karoline também conta que não teve aulas nos últimos dias, uma vez que todas as faculdades da região estão fechadas. “Não dá para se locomover. Não nos sentimos seguros. Nada me assegura que vou sair de casa e que algo de muito ruim não vai acontecer”, desabafa.

Outra estudante que aguarda pelo retorno da ‘vida normal’ é Clarissa Barcelos Sant’Ana, de 20 anos, moradora de Aracruz. Ela conta que a pequena cidade vive momentos de pura tensão: com ameaças de arrastão, o comércio começa a fechar as portas a partir das 13h, quando o clima de insegurança já começa a percorrer as ruas. “Há depredação de vitrines das lojas, houve tiroteio na pracinha do centro da cidade. Infelizmente, não consigo fazer nada, apenas acompanho mensagens, fotos e vídeos no WhatsApp. Fico dentro de casa porque me sinto mais segura”, relata.

“Existe um requerimento do município para que a força-tarefa atue aqui e nós nem sabemos se isso chegará, infelizmente”, completa a estudante de Direito do Espírito Santo.

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