Brasília – Frente ao agravamento da crise política, o comportamento da base aliada de Michel Temer no Congresso daqui por diante é uma incógnita. Para piorar, na tarde de hoje (12), o ministro Luís Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou mais uma investigação contra Temer – desta vez, por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro em caso de negociações para a assinatura de decreto sobre exploração de portos, em maio passado.
O presidente, horas antes da decisão de Barroso, chamou líderes de partidos ligados a ele para uma reunião no Palácio do Planalto e manifestou preocupação com o apoio do Congresso em relação às próximas votações que considera importantes, entre elas, a da reforma da Previdência e do novo Refis.
A conversa circulou sobre como avaliam o clima da Câmara e do Senado em relação a essas propostas. E, ainda, a posição dos deputados e senadores em relação a uma nova denúncia, que se confirmou há pouco.
A avaliação feita pela maior parte dos líderes, conforme contou um peemedebista que participou da reunião, foi de que o relatório da Polícia Federal, afirmando que o presidente teria recebido vantagens para participar de organização criminosa, divulgado ontem (11), piora a situação de Temer perante a opinião pública. O que se reflete sobre os deputados, que terão de realizar nova votação para dizer se acolhem ou não uma segunda denúncia, prestes a ser enviada ao STF pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot – a exemplo do que aconteceu com a anterior.
Por outro lado, pesará para os parlamentares o interesse em, ao tentarem salvar Temer pela segunda vez, ajudarem a livrar a própria pele, já que é grande o número dos que receberam doações da JBS (empresa comandada pelo empresário Joesley Batista, agora preso), e que estão na mira de também serem alvos de denúncias.
O conselho dado pelos líderes ao presidente e principais ministros da área de articulação política do governo foi de que sejam deixadas de lado, pelo menos nos próximos 30 dias, as pautas mais polêmicas do Congresso, como a reforma da Previdência e o Refis, na tentativa de se aguardar que o período de turbulência diminua. Dessa forma, os trabalhos se concentrariam sobre tais temas somente a partir da segunda quinzena de outubro.
Ministros e o próprio presidente pediram, por outro lado, que as lideranças busquem consenso entre a base aliada na condução dos trabalhos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que vai apurar os negócios da JBS feitos nos últimos anos.
Isto porque há um entendimento de que muitos parlamentares pretendem usar a comissão para vingança em relação a denúncias feitas por Batista contra Temer e outros políticos. E há o temor de que isso provoque efeito colateral em relação à visão do país perante o mercado internacional, o que poderia atrapalhar os programas de ajuste da economia.
O presidente, por conta disso, pediu prudência aos parlamentares. Os líderes, por sua vez, solicitaram ao presidente e aos ministros que procurem formas de capitalizar ao máximo o efeito negativo das últimas ações que resultaram em desgaste para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Já que, como Janot fica no cargo apenas até o dia 17, podem vir bem mais denúncias contra outros políticos ligados ao Executivo até lá.
Também solicitaram, conforme contou este deputado que participou da conversa, que o governo procure aprimorar ações que melhorem a visão da opinião pública sobre as reformas. Chegaram a dizer, textualmente, que as bancadas estão preocupadas com a proximidade das eleições de 2018 e com a cobrança a ser feita pelos eleitores sobre as votações de cada um.
Uma frase que teria marcado o encontro, segundo o parlamentar, foi dita no seguinte tom: “Nós queremos ajudar o governo, mas também queremos nos reeleger. Por isso, precisamos que o Planalto nos ajude a ajudar o governo”. A reunião realizada esta manhã foi considerada informal, apenas com líderes mais próximos do Planalto. Uma segunda reunião, esta com todos os líderes da base aliada, já está programada para amanhã (13), pela manhã.
Resposta à PF
A avaliação mais contundente feita pelos deputados e senadores no encontro com Temer foi que o presidente precisava dar uma resposta sobre o relatório divulgado ontem pela Polícia Federal. Se por acolhimento à sugestão ou se porque já estava sendo elaborada, uma nota oficial foi divulgada pouco depois pelo Planalto. No documento, sem citar nem a PF nem o lobista Lúcio Funaro (responsável pela maior parte das informações feitas em delação premiada que levaram ao relatório contra Temer), Michel Temer diz que existem facínoras “que roubam do país a verdade”.
No texto, o presidente ainda afirma que “bandidos constroem versões por ouvir dizer para garantir a própria impunidade”, que “reputações são destroçadas em conversas embebidas em ações clandestinas” e que o país tem assistido, nas últimas semanas, “a uma ameaça ao Estado democrático de direito”.
No Congresso, apesar de a base aliada tentar demonstrar que a principal preocupação do dia está ligada à votação da última parte da reforma política, os parlamentares ligados ao governo não deixam de demonstrar que estão apreensivos.
“É grave mais uma vez tudo o que está acontecendo. O relatório da PF envolve as figuras mais importantes do governo e aumenta as dificuldades”, disse o deputado Rubens Bueno (PPS-PR). “Tem que ser apurado outra vez, esclarecido. Não podemos continuar com o Legislativo e o Executivo vivendo neste clima de dúvida e impassibilidade”, afirmou o senador Álvaro Dias (Podemos-PR), no mesmo tom de Bueno.
O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), um dos deputados mais ligados a Temer, repetiu o discurso governista adotado desde o oferecimento da primeira denúncia contra o presidente, em maio passado. Perondi associou as denúncias às propostas de reforma e as classificou como “uma tentativa da oposição de parar a agenda reformista que está em curso”.
CPMI com Marun
Por outro lado, a CPMI da JBS teve como relator escolhido o deputado Carlos Marun (PMDB-MS), que além de ser ligado ao governo é também do grupo do deputado cassado Eduardo Cunha (atualmente preso) e recebeu doações da JBS.
Marun, ao ter sido escolhido por meio de uma articulação dos governistas, afirmou que a comissão “vai analisar as ações da procuradoria-geral da República sem medo”.
A entrada do deputado na comissão foi marcada por protestos e revelou um movimento poucas vezes visto no Congresso: até o final da manhã, nenhum senador do PMDB tinha se inscrito para integrar o colegiado da comissão – provavelmente, pelas ligações existentes entre estes parlamentares com os irmãos Batista. “Não é isso, é desinteresse pelo trabalho desta CPMI mesmo”, desconversou o líder do partido na Casa, Raimundo Lira (PB).
O Palácio do Planalto ainda não se pronunciou sobre a segunda denúncia apresentada pelo presidente da República pelo ministro Luís Barroso.