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É hora de defender a universidade

Dez 09, 2017

Por André Singer, no GGN                                                                                         

Três meses após o ato que levou ao suicídio o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), diz André Singer em seu artigo na Folha, a Polícia Federal volta à carga e repete a dose na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mesmo procedimento: levam, sem nunca intimar, pessoas em condução coercitiva para prestar depoimentos em alguma instalação policial.

Segundo Singer, Jaime Arturo Ramirez, reitor da UFMG, teve mais sorte que Luiz Carlos Cancellier, reitor da UFSC, pois foi liberado em algumas horas e não passou pela humilhação de algemas, correntes nos pés, desnudamento, revista íntima, uniforme de presidiário e ir para uma cela. Cancellier matou-se 15 dias após os horrores.

O articulista lembra que o Ministério Público foi contrário à condução coercitiva, mas a PF insistiu e a juíza acatou. Sem justificativas e sem intimação anterior.

Mas o que aconteceu na UFSC e UFMG não são atos isolados. Em 2016, a UFRGS e a UFPR sofreram com ações da Polícia Federal nos mesmos moldes. Além disso, chama a atenção os nomes das operações: "Research", "PhD", "Ouvidos moucos", "Esperança equilibrista" e "Torre de Marfim". Mais este dado vem dar corpo à conclusão de que é uma ação orquestrada e arbitrária com objetivo de desmoralizar o sistema público de ensino superior no País.

E o articulista completa, dizendo que se a sociedade civil não se unir na defesa da universidade, os danos serão irreparáveis, não só na educação, mas também na democracia.

Leia o artigo a seguir.

da Folha

É hora de defender a universidade

por André Singer

Na quarta (6), três meses depois do episódio que levou o então reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) ao suicídio, a Polícia Federal (PF) resolveu repetir a dose com o da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O procedimento foi o mesmo. Agentes chegam de surpresa à casa da vítima, que nunca fora intimada a depor, cedo de manhã, e a levam, sob vara, para alguma instalação policial.

O engenheiro Jaime Arturo Ramirez teve mais sorte do que o advogado catarinense Luiz Carlos Cancellier, sendo liberado após algumas horas. O segundo, submetido à humilhação de algemas, correntes nos pés, desnudamento, revista íntima, uniforme de presidiário e a cela onde teve que dormir, matou-se 15 dias mais tarde.

Ao deixar as dependências da PF, Ramirez, levado ao mesmo tempo que outros seis quadros da UFMG, fez uma declaração sucinta: "Fomos conduzidos de forma coercitiva e abusiva para um depoimento à Polícia Federal. Se tivéssemos sido intimados antes, evidentemente teríamos ido de livre e espontânea vontade". Alguém duvida?

Segundo os documentos disponíveis, o Ministério Público foi contrário à condução coercitiva. Mas a PF insistiu, e a juíza encarregada acatou a demanda, alegando "possibilitar que sejam ouvidos concomitantemente todos os investigados, (...) impedir a articulação de artifícios e a subtração de provas". Sem qualquer justificativa consistente, a direção da universidade, tal como havia ocorrido em setembro na UFSC, foi tratada como uma quadrilha de assaltantes, justificando o aparato —84 policiais— destinado a capturá-los.

Na realidade, de acordo com o reitor de uma instituição congênere, a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a onda de criminalização dos campi começou no final de 2016, quando "a Polícia Federal irrompeu na UFRGS [a federal do Rio Grande do Sul], em vista de uma suspeita de fraude em um programa de extensão". Em fevereiro de 2016, a própria UFPR foi atingida: 180 agentes cumpriram vários mandados de prisão e oito conduções coercitivas. Depois veio a prisão de Cancellier, a condução de Ramirez e, para cúmulo, mais uma incursão semelhante, na quinta, de novo na UFSC.

Reparem nos nomes das operações sequenciais da PF: "Research", "PhD", "Ouvidos moucos", "Esperança equilibrista" e "Torre de Marfim". É óbvio que estamos diante de uma ação orquestrada e arbitrária, usando os mecanismos de exceção abertos pela conjuntura política, com o objetivo de desmoralizar o sistema público de ensino superior no Brasil.

Se a sociedade civil não for capaz de superar divergências e se unir na defesa da universidade, teremos perdas irreparáveis. Não só na educação como na democracia.

 

 

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