Os que me conhecem sabem da minha paixão pelo futebol. Veterano aficionado pelo “nobre esporte bretão”, cresci jogando pelada em becos, ruelas, demais campos improvisados, salões e campos. Esses dias fiz as contas: frequento estádios de futebol há quase 50 anos, acompanhando o meu querido e sofrido Botafogo de Futebol e Regatas. Fora os jogos de outros times brasileiros e de outros países que faço questão de assistir pela televisão.
Pela seleção canarinho, que se firmou no cenário mundial como expressão do estilo plástico, artístico e criativo do nosso futebol, sempre senti enorme carinho e respeito. E, desde menino até hoje, Copa do Mundo é um momento mágico. Coisa de dar frio no estômago de ansiedade quando se aproxima. E quando chega faço o possível e o impossível para ver todos os jogos.
Escrevo enquanto assisto, na tarde deste sábado, 16/6, ao terceiro jogo do dia (Peru x Dinamarca). Ontem consegui ver as duas partidas, além do jogo de abertura, na quinta-feira, 14. Contudo, uma sensação inusitada assalta-me nesta Copa da Rússia: não estou nem aí para o destino da seleção brasileira na competição. É pior até do que torcer contra. É desprezo puro e simples. Refletindo a respeito, não foi difícil encontrar as razões para tamanha indiferença.
Tornou-se impossível não associar o time da CBF às dezenas de milhares de “manifestoches” que foram para as ruas, fantasiados justamente com camisa da CBF – uma espécie de entidade-símbolo da corrupção no Brasil-, pedir a ruptura da ordem constitucional e mergulhar o país, literalmente, nas trevas.
Tornou-se impossível aturar a empáfia, a máscara, a alienação e as babaquices do jogador inequivocamente mais talentoso do Brasil, que é o Neymar. Um craque fora de série dentro do campo, mas um sujeito intragável fora dele. Neymar, aliás, está se especializando em sair pela porta dos fundos de todos os times em que joga.
Tornou-se impossível tolerar o ufanismo global em torno da Copa, com apelos a um nacionalismo sem sentido, quando o país encontra-se em frangalhos devido ao golpe de estado para o qual a mídia monopolista contribuiu decisivamente. A publicidade massacrante sobre a Copa enche o saco dia e noite, com peças enfadonhas e de uma pobreza de espírito de dar dó.
Tornou-se impossível aturar o ótimo treinador da seleção virar um mega-garoto propaganda de banco e tudo que é eletrodoméstico. Com sua fala empolada e repetitiva, Tite parece um manual de autoajuda ambulante.
Tornou-se impossível imaginar o ato político deprimente e oportunista em que se transformará a recepção dos jogadores, caso se sagrem campeões, pelo golpista que tomou de assalto o Palácio do Planalto.
Nunca fui de misturar futebol com política. Mas, diante da destruição do país pelos golpistas e da carga de dramaticidade excepcional dos dias atuais, me rendo: não consegui separar as estações. Sei que muitos argumentarão que mesmo na ditadura militar boa parte da esquerda e dos democratas torceu a favor, o que é verdade.
Todavia, o desprezo pela seleção é algo mais forte do que eu. Mas é só um desabafo, um depoimento pessoal. Longe de mim querer contaminar as pessoas com a minha má-vontade incontornável com a seleção.