Desde quando concorreu à presidência da República pela primeira vez, Ciro Gomes vem revelando uma vocação quase irrefreável para a barbeiragem política. Seja com frases infelizes ou com estratégias erráticas ou pobres de lógica e racionalidade, Ciro chega à sua terceira tentativa de subir a rampa do Planalto já sinalizando que o sonho está cada vez mais distante.
Culto e dotado de fluência verbal acima da média, seu estilo contundente logo encantou os eleitores de seu estado, o Ceará, que o elegeu deputado estadual, prefeito de Fortaleza, governador e deputado federal, se não me engano nesta ordem. No governo de Itamar Franco, foi ministro da Fazenda, e no de Lula ocupou o Ministério da Integração Regional.
Seu zigue-zague partidário, navegando de A a Z do espectro político, não tardou em levantar desconfianças quanto à sinceridade de suas pregações. Sua língua solta, às vezes destrambelhada, virou obstáculo para a concretização de seu voo político mais ambicioso.
Se é verdade que Ciro se opôs ao golpe de 2016, também é público e notório que ele se negou a reconhecer que o PT, em que pese os erros cometidos ao logo de 14 anos de governo, acabou golpeado em grande medida devido aos seus acertos. O cálculo político rudimentar de Ciro lhe indicava que a derrocada do PT abria uma avenida a ser ocupada por alguém pretensamente com um discurso de centro-esquerda, como ele.
Mas, foi diante da consumação da farsa do julgamento e prisão de Lula que emergiu o lado escorpião de Ciro. Em vez de prestar solidariedade genuína ao ex-presidente pelo massacre sofrido, preferiu acenar para o que existe de pior hoje na sociedade, que é o antipetismo visceral. Outra grave derrapada política.
Ao disparar pérolas de oportunismo como “justiça boa é justiça rápida”, ou “o PT precisa parar de afrontar a justiça” ou “não me comprometo com indulto a Lula caso seja eleito”, ele deixou claro que valia tudo para evitar o efeito contágio com o PT, afinal, Lula preso despencaria nas intenções de voto rapidamente.
Como nada disso aconteceu, ao contrário, Lula mesmo encarcerado passeia sobre todos os adversários nas pesquisas e o PT recupera sua popularidade, Ciro se viu pendurado na brocha. Com o filme queimado com Lula, para quem ele se comporta como adversário, e com boa parte dos dirigentes e da base do PT, não restou outra saída a Ciro que não fosse entrar em campo em busca do apoio dos partidos do chamado centrão, que, diga-se de passagem, de centro não têm nada. Topou até moderar o discurso para atraí-los.
Deu água outra vez. Os campeões do fisiologismo e do atraso incrustados nestes partidos se bandearam para a candidatura do tucano Geraldo Alckmin depois que Temer ameaçou defenestrar seus apadrinhados no governo golpista, caso marchassem com Ciro.
Abro parênteses : quem quiser que, do meu ponto de vista equivocadamente, compare estas tentativas de alianças com partidos conservadores com as que o PT fez em nome da governabilidade quando estava no governo. No presidencialismo de coalizão brasileiro, elas são inevitáveis para se governar. A menos que esquerda eleja 300 deputados e 50 senadores. O grande erro do PT foi ter apostado alto demais nessas alianças, esquecendo-se da politização e da organização do povo. E o meu ponto aqui é analisar as opções políticas desastradas de Ciro. Fecho parênteses.”
Agora, de forma meio patética, Ciro tenta se reaproximar do PT, elogiando os governos liderados pelo partido e expressando uma preocupação fajuta com o calvário de Lula. Todavia, a Inês é morta. Se lhe interessar, ainda resta a possibilidade de entrar na fila para tentar ser vice de Lula ou de outro candidato do PT. A vida é dura.