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Agora pode! Agora dá!

Jan 11, 2019

 Por Fernando Horta, no GGN                                                                

 

Uma pequena amostragem é suficiente para a verificação do aumento de crimes de ódio, pelo país afora, após a eleição de Bolsonaro. Não que o Brasil não fosse uma sociedade preconceituosa, violenta e sem o mínimo respeito pelo “próximo”, pelo “cidadão” ou pelo “ser humano” (tanto faz aqui usar as designações oriundas de pensamentos distintos com mesmo interesse). Tenho escrito, aqui e acolá, que uma das características (e força) do fascismo é o compartilhamento do uso legítimo da força. Qualquer estudante de segundo semestre de um curso de humanas conhece a definição clássica de Estado de Weber como o “monopólio legítimo do uso da força”; pois o fascismo abre mão deste monopólio, a violência social é compartilhada com os “apoiadores”, “seguidores” ou “correligionários”. O fascismo encanta porque concentra poder ao dispersá-lo, e da forma mais perversa possível.

Uma das propostas-chave, e uma das únicas claras de Bolsonaro, era a ampliação do direito ao uso de arma de fogo. Uma parte dos analistas de esquerda têm, erroneamente a meu ver, estabelecido uma relação deste ponto com o “fracasso do campo progressista em propor algo para segurança pública” e os mais de 60 mil assassinatos por ano no Brasil. Há uma correlação lógica que parece explicativa: a esquerda supostamente não “abraçou” a causa da “segurança”, são assassinados mais de 60 mil pessoas por ano no Brasil (mais do que praticamente o resto do mundo somado) e surge um candidato que “capitaliza” este discurso.

A correlação não é, porém, explicativa e nem tampouco lógica. Bolsonaro, por exemplo, não foi mais votado em locais com alta taxa de criminalidade (na estratificação por bairros, por exemplo). Os gráficos das manchas (de voto e de crimes) não são conclusivos para afirmar que foi a questão da segurança pública a definidora. O movimento de extrema direita cresce no mundo todo, e em locais com baixíssimo número de mortes por cidadão, como na Europa, por exemplo. Parece mais lógico que a histeria da igualdade social, que acometeu a classe média brasileira ressignificou a questão da segurança pública, dando a ela o condão de ser justificativa para o aumento da violência de Estado e não sua causa.

Se pudéssemos definir o que é “Estado Mínimo” haveríamos de escolher quais os serviços ele deve ou não se responsabilizar. Para a direita e extrema direita Educação, Saúde, Previdência, proteção ao trabalho e controle econômico são áreas em que o Estado não deveria atuar. Entretanto, os mesmos grupos são ávidos por impor regras e sanções criminais a todo tipo de comportamento que divirja de suas concepções éticas. Fortalecem a polícia, o exército, a justiça e todo o aparato repressor do Estado, impondo padrões e leis até para o uso privado dos próprios corpos dos cidadãos. É ilógico defender “estado mínimo” e aumentar o jugo e controle deste estado sobre a vida e o comportamento dos sujeitos. É ilógico se não se observa que, por trás da retórica moralista ou da “segurança pública” está o interesse imediato na defesa da propriedade privada usando recursos públicos.

Se as populações mais pobres pudessem escolher quais partes do Estado seriam extintas para atender o ideal de “estado mínimo”, certamente a polícia, o exército, a diplomacia, a justiça e o controle do câmbio seriam áreas jogadas de lado. O custo-benefício destas áreas, para quem ganha até três salários mínimos é tremendamente negativo. Pobre só conhece a polícia na ponta da borracha, apanhando ou sendo morto “por engano”. Da justiça só sabe que só o auxílio moradia dos juízes é o sonho-patamar de ganhos para seus filhos e talvez netos. Exército, diplomacia e controle de câmbio, estas populações só enxergam em filmes ou em demonstrações abjetas de incompetência, como no estado do RJ.

Fica claro que a pauta da “segurança pública”, no Brasil, funciona como um gatilho social a reunir a classe alta e média contra os desaventurados e mais necessitados. Exatamente da mesma forma que a “imigração” nos EUA e na Europa ou a questão dos “judeus” na Alemanha nazista. É uma figura retórica que soa verdadeira e que esconde a ideia de fortalecer o Estado para proteger-se dos mais pobres.

O liberalismo fez isto durante todo o século XIX e XX com a construção e reforço das noções de “ordem”, “lei”, “crime”, “pena” e etc. Litros de tinta já foram gastos para mostrar que, se bem estas noções não são totalmente formadas pela percepção da luta de classes (em benefício das elites), elas assim são utilizadas. O exemplo do Brasil é eloquente. A maioria dos nossos presos é preta, moradora de periferia, jovem e homem com problemas com as leis referentes às drogas. Aquelas leis que dizem que helicóptero com meia tonelada de cocaína e filho (branco) de desembargadora com 130 quilos de maconha no carro são “circunstanciais” e não merecem atenção ou prisão do estado, mas um jovem negro com 30 gramas de maconha é preso, trancafiado desumanamente em nossos presídios e pode pegar, pela lei, de cinco a 15 anos de cadeia.

Da noção tosca de “individualismo”, juntando com a necessidade de “diminuir o Estado”, “preservar a moral e os bons costumes”, surge a ideia de compartilhar o uso da força com o “cidadão de bem”. O fascismo se diferencia de uma ditadura militar exatamente neste ponto. A liberação da posse de armas – que pode sair em forma de decreto presidencial nesta sexta feira – é a base para a formação de milícias fascistas pelo país, e vai nos colocar numa trilha sem volta de pesadelo e violência.

Desde a eleição de Bolsonaro o país vive o clima da liberalização da violência. Mensagens como “já tá liberado matar veado?”, “tem que meter bala em esquerdista, quilombola e índio” ou mesmo em professores e artistas, são comuns nas redes sociais e áreas públicas pelo Brasil afora. O sentimento é de que “agora dá, agora pode”. Tudo o que antes era proibido pelo Estado, agora é permitido e a extinção física das oposições é promessa corrente na boca do atual mandatário do Brasil e também de seus filhos, que não se sabe que cargo efetivamente exercem.

Se o controle da violência é uma característica essencial do Estado e se este controle tem efetivamente um viés de classe, a defesa das classes mais baixas é pela construção de uma racionalidade restritiva aos poderes de Estado. E isto, longe de ser uma bandeira comunista, é oriunda dos pensadores burgueses do século XVII. Locke, Rousseau, Montesquieu e etc. defenderam ferozmente a racionalidade sobre a violência e o Estado tendo como fronteira os direitos inalienáveis do cidadão. Isto é “liberalismo”.

Não têm o direito de usarem o adjetivo liberal os que criam braços do Estado para fiscalizar o corpo, as ideias, as práticas civis ou religiosas de cidadãos com a desculpa da “ordem”, da “moral” e dos “bons costumes”. O nome disto é FASCISMO e ele vem acompanhado de massas ensandecidas armadas e empoderadas por um líder que permite tudo aos aliados e não garante nem a vida dos opositores.

Se o decreto fascista sair na próxima sexta feira, sugiro que a esquerda compre armas. Bastante. E aprenda a usá-las.

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