Os antigos defensores da Lava Jato, que festejaram quando a prisão de Lula impediu sua vitória eleitoral, reagem com perplexidade às estultices do governo Jair Bolsonaro. Ignorando a óbvia relação causal dos fenômenos, fingem que o jabuti subiu na árvore sozinho, como se a tragédia anunciada fosse um mero acidente de percurso na Cruzada Anticorrupção.
É fácil notar que a Lava jato enriquece delatores, advogados e multinacionais estrangeiras. Já considerá-la benéfica para o povo que a financia depende do repertório de valores de cada um. Se derrotar o lulismo compensa quaisquer sacrifícios, colapsos e prejuízos, maravilha, deu certo. Se nada justifica eleger milicianos e dementes obscurantistas, a conta não fecha.
O meio-termo, usado por muitos para fugir do dilema, disfarça a escolha pela primeira opção. Um dos apelos do imaginário fascista reside justamente em prender (e matar) bandidos. Não é outra a origem do discurso de que a corrupção supera negativamente a desigualdade social, a incompetência administrativa e o racismo institucionalizado. Ou o próprio fascismo.
E precificar os lados da balança não ajuda a equilibrá-la. Quantas fortunas recuperadas pagam a destruição da universidade pública, da cultura, dos direitos individuais? Quantos larápios aposentados ou irrelevantes compensam a inelegibilidade de um candidato favorito a presidente da República, o único capaz de impedir a escalada reacionária?
A agenda saneadora jamais precisaria da Lava Jato e do resultado eleitoral que ela gestou. As condenações de burocratas e políticos metidos em esquemas antigos e notórios seriam resolvidas há décadas, sem rótulos espalhafatosos, desde que policiais, procuradores e juízes cumprissem suas prerrogativas básicas. Todos esses casos dispensariam os arbítrios aplicados a Lula em nome da impunidade alheia. Só a excepcionalidade atingiria o petista.