Brasília – Enquanto nos ministérios e nos corredores do Congresso Nacional a expectativa é sobre a situação da presidenta Dilma Rousseff e a do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) nos próximos meses, na Procuradoria-Geral da Republica (PGR) o clima é de tensão semelhante, mas devido à recondução ou não do atual titular, Rodrigo Janot. Procuradores, subprocuradores, advogados e assessores do Ministério Público Federal (MPF) querem saber como fica a situação de Janot e já questionam dificuldades que a presidenta Dilma terá para reconduzi-lo, no caso dele ser eleito na lista tríplice. É certo que seu nome corre grande risco de ser rejeitado pelos senadores – uma vez que caberá ao Senado dar a palavra final sobre a indicação.
Informações de bastidores mostram que a preocupação do grupo ligado ao PGR está relacionada à continuidade das ações com um sucessor de perfil diferente, já que o principal adversário de Janot é o procurador Carlos Frederico Santos, que tem postura diversa da do atual procurador-geral, com quem não se dá. Ao mesmo tempo temem mais estremecimentos, diante da fúria dos parlamentares, como a retaliação feita na última semana e divulgada só hoje (21), de pedidos feitos ao Tribunal de Contas da União (TCU) para que investigue dois contratos firmados pela procuradoria sem licitação.
“O procurador me escolheu para investigar. Ele não fez a mesma pesquisa que fez com as doações para todos os parlamentares”, criticou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). “Este homem nem sequer ouviu previamente as pessoas que fazem parte da lista da Lava Jato”, acrescentou o ex-senador Fernando Collor (PTB-AL) – que teve documentos e três carros apreendidos na última quarta-feira (15).
“Houve um exagero descomunal nesta operação. Não se pode entrar em imóveis do Senado sem autorização do próprio Senado e acompanhamento da polícia legislativa”, rebateu igualmente, o presidente do Congresso, Renan Calheiros (PMDB-AL) – citado na lista de Janot encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF) de políticos a serem investigados por suspeita de envolvimento na Lava Jato.
De acordo com a área técnica da PGR, os contratos dizem respeito ao aluguel de um imóvel e um trabalho de uma empresa de Comunicação, em casos em que havia inexigibilidade de licitação, e não será difícil para a procuradoria provar isso. O problema é que a questão mostra que é só o começo da investida a ser feita pelos parlamentares daqui por diante.
Outras possibilidades
Por causa disso, são aventadas duas possibilidades, embora nenhum dos candidatos nem demais procuradores queiram dar declarações oficiais sobre o assunto. Uma delas é a previsão de Janot aproveitar as últimas semanas que antecedem a eleição da ANPR para turbinar os contatos com os procuradores nos estados, um corpo a corpo que ele tem evitado, em função dos trabalhos em Brasília, principalmente com a Lava Jato.
Caso venha a fazer isso, conforme apontam representantes deste grupo, são fortes as chances do procurador-geral ser eleito pela lista tríplice com larga margem de votos na frente dos demais, o que poderia inverter o quadro e deixar o Congresso em situação constrangedora se não aprovasse o seu nome.
Outro grupo defende que Janot, internamente, apoie a candidatura do procurador Mario Bonsaglia, considerado hoje o terceiro da lista. Seria uma forma de não se desgastar com uma rejeição do Senado e, ao mesmo tempo, conseguir passar a Procuradoria-Geral para um colega com quem possui ideias em comum e tem postura mais moderada que Carlos Frederico Santos, seu principal adversário.
Mas para pessoas próximas a Janot, nenhuma das duas alternativas agrada a ele, que assumiu o cargo prometendo criar uma força tarefa para ampliar, por parte do MPF, a investigação e combate aos casos de corrupção no país.
“Ele toca o trabalho como uma missão que tem na vida, e será muito difícil se tiver de abrir mão. Por outro lado, como bom mineiro, não é de ir às últimas consequências sem pensar. Se ele avaliar até 2 de agosto que não haverá condições de ter o nome aprovado no Senado, muita gente aposta que há, sim, possibilidade de que trabalhe para o Bonsaglia”, afirmou um procurador hoje aposentado.
De estilo discreto, mas ao mesmo tempo do tipo que acompanha todas as ações, tendo chegado de madrugada para dar uma última orientação aos procuradores na última quarta-feira, antes de iniciarem as buscas nas casas dos senadores, Janot comentou sobre as acusações e críticas feitas a ele somente ontem (20), numa nota lacônica onde declarou que “investiga fatos, jamais instituições”.
Na nota, afirmou ainda que o Ministério Público “sempre buscou o diálogo permanente com os Poderes constituídos” para fortalecer a República e lembrou que isso “passa necessariamente pelo funcionamento de um Senado Federal altivo e de pé” – numa forma de chamar a atenção para os senadores.
“Como é de conhecimento público, a Constituição Federal atribui ao Procurador-Geral da República, sob supervisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a condução de investigações de forma sóbria e responsável em relação às altas autoridades da República, sejam elas do próprio Ministério Público ou dos poderes Legislativo, Judiciário ou Executivo”, destacou, também.
Moderado e experiente
Considerado um procurador sem radicalismos, Mario Luiz Bonsaglia – que está hoje em terceiro lugar na disputa – foi membro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e atuou como vice-presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe). É bem quisto entre os colegas e conhecido como um procurador que busca sempre o aprimoramento do MP. Dentre suas ações no conselho, Bonsaglia trabalhou na uniformização de inspeções em estabelecimentos prisionais.
Mas para que o nome de um procurador chegue ao Senado é necessário, ainda, um longo caminho. Primeiro, a ANPR vai divulgar a lista tríplice, a ser formada por três procuradores indicados pela categoria, com o número de votos e a respectiva colocação de cada um deles. Tradicionalmente, depois que é instituída a lista, a presidenta Dilma Rousseff decidirá por um nome. Depois disso vem a terceira etapa que é quando a indicação da presidenta precisa ser aprovada pelo Senado em votação secreta.
O cargo de PGR é de livre indicação do presidente da República. Ou seja: Dilma poderá acolher algum nome da lista, mas também pode preferir indicar outro procurador que não conste na relação. A lista tríplice da ANPR passou a ser instituída a partir de 2001, depois de movimento feito pelos procuradores, mas só começou a ser levada em conta em 2003, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou Claudio Fonteles para a PGR. Depois disso, todos os candidatos ao cargo saíram da lista.