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Jornais faturam com propaganda enganosa disfarçada de notícia

Set 07, 2020

Por João Filho - The Intercept Brasil                                                                                               

 

Ilustração Rodrigo Bento - The Intercept Brasil

AO FINAL de textos publicados em sites de jornalismo, é comum os leitores se depararem com uma fileira de pequenos anúncios sensacionalistas disfarçados de conteúdo jornalístico. Os títulos são sempre apelativos — conhecidos como clickbaits —, feitos com o único objetivo de fazer o visitante clicar. Esses anúncios geralmente giram em torno de dicas de saúde, novidades sobre celebridades e maneiras fáceis de enriquecer. Quando o leitor clica, é levado para sites desconhecidos de baixíssima qualidade, que oferecem algum produto duvidoso. O problema não são apenas as chamadas sensacionalistas, mas o conteúdo dos textos. Vários deles são falsos. Leitores de sites jornalísticos sérios estão a um clique de distância de fake news.

Esse modelo de veiculação automática de anúncios em grandes sites vem sendo criticado nos Estados Unidos pelo menos desde 2016. Editores de alguns dos principais veículos americanos passaram a questionar os efeitos desse modelo de anúncios sobre a credibilidade das suas marcas. As revistas Slate e a The New Yorker decidiram interromper a exibição desses anúncios em seus sites. Um artigo sobre misoginia de Trump na Slate, por exemplo, era acompanhado de uma chamada para a seguinte notícia “10 celebridades que perderam seus corpos sarados”. Abaixo da manchete, fotos mostrando o antes e depois do corpo de uma mulher famosa completam a baixaria. Na campanha de 2016, esses espaços patrocinados também foram usados para espalhar mentiras sobre a candidata democrata Hillary Clinton.

Taboola e Outbrain são as duas grandes empresas que dominam esse mercado dos anúncios clickbait. Fundadas em Israel, elas cresceram nos EUA e têm se espalhado pelo mundo. Oferecem aos sites de jornalismo uma solução que automatiza o conteúdo sugerido e reconhece o interesse do leitor a partir de pistas contextuais, como o histórico de navegação, por exemplo. Assim, a todo momento o leitor recebe indicações de conteúdo do próprio site, o que faz com que ele permaneça consumindo notícias por mais tempo. Até aí, tudo bem. O problema é que, em troca desse serviço, Taboola e Outbrain incluem nessas páginas propagandas travestidas de notícias. Os anunciantes pagam para inserir essas chamadas nos sites associados, que também ganham uma fatia dessa grana. As duas empresas estão prestes a concluir uma fusão para dominar de vez o mercado dos clickbaits.

No Brasil, essas empresas chegaram com força. Um jornalista de dados com quem conversei, que preferiu não se identificar, vem acompanhando os links patrocinados do Taboola e Outbrain no rodapé dos grandes sites há algum tempo. Foi ele quem me passou boa parte das informações que guiaram esse texto. Em um levantamento sobre páginas de fake news, o jornalista identificou que as mentiras relacionadas à saúde eram bem mais volumosas que as relacionadas à política. Percebeu também que os links patrocinados no pé das notícias tinham se transformado em uma espécie de “fakeoduto”.

Boa parte dos veículos de grande imprensa brasileira aderiu a esse modelo de anúncios. Os sites da Folha de S. Paulo e do jornal O Globo, os principais jornais do país, estão associados respectivamente ao Outbrain e ao Taboola. Quando o visitante continua a descer a barra de rolagem após a leitura de uma notícia, se depara com um quadro com esses anúncios sensacionalistas misturados com links para notícias do próprio jornal. Apesar de haver uma tarja minúscula indicando ser conteúdo patrocinado, a diagramação dá a entender que as manchetes sensacionalistas dos anúncios são conteúdos produzidos pelo jornal.

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