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Plano de mineração de Bolsonaro ameaça indígenas e fragiliza leis

Out 01, 2020

Por Lú Sodré, no Brasil de Fato                                                                                            

Mais espaço para o capital estrangeiro, flexibilização das leis ambientais, destruição do meio ambiente e ofensivas contra direitos dos povos indígenas. Segundo análise do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) e do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), essas serão as consequências do Programa de Mineração e Desenvolvimento (PMD) anunciado na última segunda-feira (28) pelo governo federal.

O programa define a agenda da gestão Bolsonaro para a mineração no período de 2020 a 2023 e inclui um total de 110 metas divididas em dez eixos de concentração temática. Entre elas o avanço da mineração em novas áreas, segurança jurídica às empresas, a ampliação do conhecimento geológico do setor, investimentos e financiamentos, inovação e sustentabilidade.

O PMD vem sendo trabalhado desde 2019 com discussões que estimularam também a apresentação do Projeto de Lei 191, que propõe a regulamentação da atividade minerária em terras indígenas assim como a construção de hidrelétricas. A proposta, amplamente criticada pela sociedade civil, foi barrada pela oposição e está parada no Congresso Nacional.

Jarbas Vieira, da coordenação nacional do MAM, afirma que, caso o PL seja aprovado, os impactos socioambientais serão extremamente negativos. A começar pelo ataque ao modo de vida e direito dos povos originários. 

"Os territórios indígenas são locais onde há a preservação da biodiversidade, um equilíbrio que no resto do país já se foi. Assim como está indo no Pantanal, no território amazônico, no pampa do RS e o próprio Cerrado que corre risco de desaparecer. Essa política de desenvolvimento desenfreado para cima dos territórios é acéfala, é uma política destruição. Querer dizimar os povos originários do nosso país é um crime. É uma política genocida e colonizadora”, critica Vieira.

Um estudo feito pela Universidade Federal de Minhas Gerais (UFMG), em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Queensland, na Austrália e com o Instituto Socioambiental (ISA), revelou que a liberação da mineração nesses novos territórios pode aumentar em mais de 20% o impacto da atividade na região amazônica e gerar perdas de até US$ 5 bilhões em serviços ecossistêmicos, como regulação de chuvas e produção de alimentos.

Para Heider Bazo, da coordenação nacional do MAB, o plano integra o pacote de iniciativas negativas que tem sido aprovadas com Ricardo Salles no ministério do Meio Ambiente. 

“Vemos como mais uma forma de passar a boiada, como o ministro falou, e aproveitar o contexto para aprovar coisas que em outras conjunturas não seriam aprovadas de forma tão fácil.”

Além da mineração das terras indígenas, segundo ele, o PMD prevê o aumento da mineração sobre zona de amortecimento, a agilização dos processos de outorgas e abre brecha para que haja financiamento público voltado à atuação da iniciativa privada no setor. 

Bazo destaca que o plano e as declarações de integrantes do governo deixam claro a cobiça sobre a Amazônia.
  
“Assim como o o agronegócio avança na região em busca de melhores terras para expandir a soja e o milho, a mineração também avança sobre o subsolo. Sabemos que lá há grandes quantidades de minerais raros e o governo descreve alguns com especial interesse, como o nióbio”, comenta.

Mercado internacional

Atrair empreendedores do mercado interno e – principalmente – externo é uma das prioridades do Programa de Mineração. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido), por exemplo, participou do lançamento do plano ao lado de Bento Albuquerque, ministro de Minas e Energia e declarou que “o Brasil tem muito potencial para explorar o setor junto com países estrangeiros”.

Na avaliação de Jarbas Vieira, a negociação dos títulos minerários na Bolsa de Valores e a consequente intensificação da especulação no setor é um aspecto grave da política de Bolsonaro, que, de acordo com ele, foi iniciada no governo Temer.  

Ele afirma que Agência Nacional de Mineração (ANM) se articula para se adequar aos interesses dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e União Europeia desde o ano passado. Grupos que demandam, justamente, a facilitação do processo de exploração mineral. 

“O que teremos é uma flexibilização e aceleração na emissão do título minerário e instalação do empreendimento. Isso quer dizer que licenciamento ambientais, que são trâmites essenciais para identificação do impacto e responsabilização das empresas, serão fragilizados. Perdemos a qualidade do estudo”, diz, acrescentando que o processo é uma grave ameaça à soberania brasileira.

“O capital financeirizado não pode vir dizer onde vai explorar e as condições para isso. No fundo é isso que está colocado”. 

Em conseguinte à fragilização do processo de licenciamento, a flexibilização da fiscalização das barragens, para Vieira, é certa. “Isso significa que outros rompimentos acontecerão com toda certeza”, lamenta.

Modelo predatório

Outro ponto do PMD considerado sensível é o incentivo à mineração em regiões mais pobres, com o argumento de que elas se desenvolverão com a chegada da exploração mineral.

No entanto, Heider, representante do MAB, enfatiza que os impactos sociais da mineração para as cidades estão longe de ser o desenvolvimento vendido pelo governo. 

“As comunidades carentes historicamente se tornam mais carentes com o exercício da mineração, que deixam impactos sociais, econômicos e ambientais no decorrer dos anos de forma crônica quando não deixam de forma aguda, que é o caso de rompimento de barragens”, declara.

Como exemplo, ele cita o rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho, ambas em Minas Gerais, e a insuficiente reparação por parte da Vale e da BHP Billiton, responsáveis pelas minas.

O coordenador do MAB sublinha que a atividade minerária traz consequências cotidianas à saúde física e mentais das populações locais de ribeirinhos, pescadores e agricultores, seja pela contaminação pelos minérios e desenvolvimento de doenças físicas ou pelo sofrimento psicológico dos atingidos à espera da reparação.

A chamada elevação do grau de sustentabilidade do setor é referida diversas vezes pelo Plano. Mas, diante da destruição ambiental em curso, os ativistas têm certeza que as propostas não sairão do papel.

“Chega a ser ridículo um governo como esse colocar que ele terá responsabilidade com os impactos ambientais e sociais causados pela mineração. A prática do governo não é de preocupação com os povos ou com meio ambiente, vide o que acontece agora com as queimadas e o que o governo tem feito com os garimpos ilegais nas florestas nacionais. Praticamente o perdão do que eles têm feito”, critica Vieira.

 

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