A resposta de Chico César a uma fã é prova de que nem tudo está perdido na música brasileira.
O que muitos interpretam como grosseria é, na verdade, coragem, postura e decência.
Movida por boas intenções — o inferno está cheio disso —, ela pediu-lhe, “carinhosamente”, que evitasse canções “de cunho político-ideológico”.
Chico foi no alvo.
“Não me peça um absurdo desse, não me peça para silenciar, não me peça para morrer calado. Não é por ‘eles’. É por mim, meu espírito pede isso”, respondeu no Instagram.
“Não vim botar você para dormir, aqui estou para acordar os dormentes”.
É disso que se trata.
Chico não é refém de seu público, mas obedece à sua consciência.
Ele não está acima ou abaixo do cidadão comum. Ficar omisso diante do fascismo é defender a morte, uma posição política ainda pior.
É raro isso ocorrer. Tom Zé, por exemplo, sucumbiu à patrulha de seus seguidores quando fez a narração de um comercial da Coca-Cola para a Copa de 2014.
Foi xingado de “mané”, “velho babão”, “bundão”, “corrompido” etc. Tom Zé, que não tem o dinheiro que seus colegas de Tropicália têm, foi obrigado a doar o cachê.
Chico pertence à linhagem de Bob Dylan.
Em 1965, Dylan desafiou os fiéis que o acusavam de traidor por ter “eletrificado” seu som.
Adeus, violão. Tocou guitarra, foi vaiado e quase agredido fisicamente.
Num show no Albert Hall, em Londres, no mesmo ano, acompanhado do grupo que viraria a fabulosa The Band, um fulano gritou da plateia: “Judas!”.
Ele respondeu no microfone: “Eu não acredito em você. Você é um mentiroso”. E então se vira para a banda e diz: “Toquem alto pra caralho” (“Play it fucking loud”).
E entra “Like a Rolling Stone”.
Viva Chico, viva Dylan, viva a arte.
Enquanto isso, as Elbas Ramalhos passeiam entre os comunistas espalhando covid-19 no calo dos cristãos.