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Conversa solta sobre 2022

Ago 17, 2021

Por Bepe Damasco                                                                                                                                  

Foto: Ricardo Stuckert

1) A reação da sociedade democrática e a mobilização popular serão fundamentais para garantir que haja eleição em 2022, que o resultado seja respeitado e que os eleitos tomem posse.

2) O favoritismo de Lula é incontestável, mas o déficit de convicção democrática da elite brasileira e o jogo sujo ao qual recorre com frequência devem manter aceso o sinal amarelo na esquerda. A manifestação explicitamente golpista de um economista do banco Santander pode ser só a ponta do iceberg.

3) A escalada golpista de Bolsonaro, seja mirando as urnas eletrônicas, os ministros do STF ou os freios e contrapesos próprios da ordem democrática, é inversamente proporcional ao resultado das pesquisas, tanto as feitas pelos institutos mais conhecidos como as internas encomendadas pelo próprio governo. Bolsonaro, mais do que ninguém, sabe que no voto a eleição está perdida.

4) Exagero, dirão alguns. Mas, com 25% de aprovação e em queda não há como vencer uma eleição em dois turnos. Para a desgraça do capitão nazista, o fantasma não é só Lula. Nas simulações de segundo turno, ele perde para todos os outros postulantes, apanhando também de Ciro, Dória e Mandetta.

5) Chegamos, então, aos possíveis trunfos que qualquer dono de caneta presidencial dispõe. Longe de subestimar o poder de fogo do cargo para alavancar a popularidade através de medidas de impacto, vejo a natureza e o caráter do governo Bolsonaro como sérios obstáculos para concretização deste objetivo. O nó da questão é o compromisso de Guedes/Bolsonaro com o ultraneoliberalismo mais tosco e sua política fiscal restritiva bem ao gosto do capital financeiro. Cruzar essa fronteira significaria para Bolsonaro perder em definitivo o apoio dos donos do dinheiro.

6) Por certo, a economia vai crescer nos próximos meses, uma vez que parte de um patamar de terra arrasada, de fundo de poço. Aliás, isso já vem acontecendo há alguns meses. O problema é que a política econômica em vigor impede que o aumento quantitativo do PIB se reflita na melhoria dos padrões de vida das pessoas. Ao contrário, com as taxas de investimento público e privado mais baixas da história, sem qualquer política de geração de emprego e renda, o Brasil hoje, além de bater recordes de desemprego, exibe uma população de 40 milhões de trabalhadores precarizados e desalentados. A carestia dos gêneros alimentícios faz a fome se disseminar. Gasolina e gás de cozinha viraram objetos de luxo. Resumo da ópera: nada indica que o crescimento do PIB chegará na ponta e abrandará  o sofrimento do povo. E a nova roupagem do programa Bolsa Família, com um pequeno aumento do benefício e rebatizado como Auxílio Brasil, terá o condão de mudar essa realidade? É pouco provável. 

7) Não acredito que os grupos de mídia e parte importante dos capitalistas nativos sejam incapazes de construir uma candidatura presidencial, a tal terceira via, minimamente competitiva. Aconteceu em 2018? Sim, mas o fenômeno da ascensão avassaladora do fascismo pegou de surpresa a direita tradicional. Se ganhar musculatura, o candidato da terceira via, embora não seja capaz de  ameaçar a liderança de Lula, pode vir a incomodar  Bolsonaro e travar com ele uma disputa acirrada pela vaga no segundo turno. Ciro Gomes também pode aparecer nesta briga. Hoje, faltando um ano e dois meses para a eleição, a impressão que se tem é que Bolsonaro chegará ao segundo turno. Mas a erosão de seu governo e de sua imagem indica que isso não será propriamente um passeio no parque.

8) Tampouco creio que a esquerda vença eleição presidencial no Brasil  no primeiro turno, algo que nem Lula no auge da popularidade e do prestígio conseguiu. Excetuando-se 2002 e 2014, quando as pesquisas não sugeriam as vitórias de Lula e Dilma no primeiro turno, em 2006 e 2010, os candidatos petistas obtinham nos levantamentos intenções de voto capazes de assegurar a vitória já no primeiro turno. Isso até a semana anterior à primeira rodada. Contudo, na reta final, a mídia e a direita pegaram pesado e garantiram a realização do segundo turno. Existe direita no Brasil. Ela é poderosa e, em geral, desprovida de escrúpulos.

9) Hoje o antibolsonarismo é mais forte do que o antipetismo. E Lula como candidato enfraquece ainda mais a aversão de alguns segmentos da sociedade ao PT, especialmente nas classes média e alta. Não são poucos os eleitores que não votam no PT, mas apoiam Lula. Vejo como frágil, portanto, o argumento de que o antipetismo pode ser fatal para Lula. Se em 2018, no auge do antipetismo, o candidato do PT, Fernando Haddad, só foi derrotado devido à farsa da facada e às fake news criminosas da campanha de Bolsonaro, imagina agora.

10) Não vale nem a pena perder tempo com elucubrações sobre a possibilidade de uma chapa de unidade da oposição ao bolsonarismo ainda no primeiro turno. Na vida como ela é, isso é impossível. União só no segundo turno. A menos que surjam pontos completamente fora da curva até lá, tudo leva a crer que teremos uma chapa encabeçada por Lula, com o apoio do PCdoB, do PSOL e, possivelmente, do PSB, tendo como adversários Bolsonaro, Ciro e, provavelmente, Dória como representante da terceira via. Mas não será surpresa se o campo conservador apresentar mais de uma candidatura. O ex-ministro Mandetta, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, estão no páreo.

 

 

 

 

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