O noticiário insistente e a torcida da imprensa por uma candidatura de terceira para se contrapor a Lula e Bolsonaro sugerem que o Brasil é uma democracia madura, que conta com partidos programáticos e com políticos propensos à unificação de projetos, se pautando por causas coletivas, e não vai por vaidades e interesses pessoais.
Como nada disso é verdade, muito pelo contrário, cravar que o campo liberal conservador apresentará apenas uma candidatura é uma aposta para lá de arriscada. Tomando a realidade como medida de todas as coisas, a fragmentação da oposição de direita a Bolsonaro é hoje o cenário mais provável.
Algumas movimentações já dão pistas razoavelmente seguras disso:
1) A julgar pelo que tem sido dito e escrito por dois importantes porta-vozes do Grupo Globo, os jornalistas Merval Pereira e Miriam Leitão, os Marinho se inclinam para o apoio ao candidato rival de Dória nas prévias do PSDB: o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. Seu ataque incessante aos sindicatos e movimentos sociais, o corte sistemático de direitos dos servidores e sua obsessão por reformas ultraneoliberais são vistos pela Globo como credenciais para o cargo de presidente da República. As manifestações de outros tucanos de alta plumagem em apoio a Leite, como Tasso Jereissati, Arthur Virgílio e Alckmin (que ameaça deixar o PSDB, se Dória vencer a disputa interna) revela que a batata de Dória está assando em seu partido.
2) Alguém acha mesmo que o governador de São Paulo, a soberba e a arrogância em pessoa, depois de ter movido mundos e fundos pela vacina Coronavac – diga-se de passagem com um resultado meritório, independentemente da motivação que o guiou -, aceitará de bom grado uma eventual derrota nas prévias? Até as paredes do Palácio Bandeirantes sabem que, se isso ocorrer, ele baterá asas rumo a um partido de aluguel, ainda que seja um nanico, que lhe garanta legenda para concorrer ao Planalto.
3) Em termos de ocupação de espaços institucionais, o PSD, liderado pelo ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, vem experimentado um crescimento considerável. Nas eleições municipais do ano passado, foi um dos partidos que mais elegeu prefeitos. Kassab, no momento, está empenhado em tirar do DEM e trazer para seu partido o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. A ideia é tentar emplacar o nome de Pacheco como candidato da terceira via. Mas, no caso de Dória se lançar candidato sobre pau e pedra dinamitando de vez a unidade em torno da terceira via, não será surpresa se o PSD optar por um candidato para chamar de seu. Afinal, estaria aberto o precedente para o liberou geral de candidaturas na direita não bolsonarista.
4) Vendo a banda passar para ver o que vai dar, temos ainda o senador Alessandro Vieira, do Cidadania, que, embora tenha se lançado para compor mais à frente, pode acabar concorrendo diante da divisão das forças conservadoras, com o propósito de pavimentar projetos políticos para o futuro.
5) Por fim, há a irremovível candidatura do Ciro Gomes e as especulações em torno dos nomes de Mandetta, Simone Tebet e até, cara de pau suprema, de Sérgio Moro.
Em síntese, não faltam apenas votos à terceira via, mas também um mínimo de unidade de ação como bloco ideológico.