Foto: Prefeitura São Paulo/CC
A Fundação Oswaldo Cruz divulgou nesta terça-feira (28) uma nota técnica sobre a necessidade de disseminação da vacina contra a covid-19 em crianças. A Fiocruz, referência em epidemiologia no Brasil e reconhecida globalmente, assinalou a importância. “A publicação, embasada em estudos e critérios científicos, ressalta que a imunização da faixa etária de 5 a 11 anos vai colaborar com a mitigação de formas graves e óbitos por covid-19 nesse grupo, reduzirá a transmissão do vírus. E será uma importante estratégia para que as atividades escolares retornem ao modo presencial”, informa.
O posicionamento está em consenso com a comunidade acadêmica global. Em 39 países, o processo já iniciou. No Brasil, o avanço da vacinação enfrenta a oposição do presidente negacionista Jair Bolsonaro. O presidente atuou durante toda a pandemia para impedir a mitigação das mortes. Além disso, disseminou mentiras sobre a eficácia e segurança de vacinas; em especial para os mais jovens. Opositor à ciência, Bolsonaro mesmo afirma não ter se vacinado e diz que não deixará sua filha mais nova, de 11 anos, tomar o imunizante.
A posição da Fiocruz também é compatível com análise da Agência Nacional da Vigilância Sanitária (Anvisa). O órgão do governo vem sofrendo perseguição do presidente e de apoiadores após seguir a ciência e recomendar a vacinação. “Mais uma vez reiteramos que os pais de crianças de 5 a 11 anos devem ser claramente informados dos benefícios da vacinação e respeitados em suas decisões, quaisquer que sejam as decisões que tomem, quanto a aplicação da vacina contra a covid-19 em seus filhos”, disse a Anvisa em extensa nota técnica divulgada na última quinta-feira (23).
Negacionismo mata
“A desinformação ameaça o sucesso dos programas de vacinação em todo o mundo”, afirma a agência, defendendo ações coordenadas para combater rapidamente a disseminação de notícias falsas sobre as vacinas. “Não podemos assistir ao desmonte na confiança em usar um produto que salva vidas”, completou o órgão.
A Fiocruz ressalta que indicadores “de mundo real”, ou seja, sobre a aplicação de vacina em crianças em andamento, são positivos e inddubitáveis. “Os mais recentes indicadores mostram que, nos EUA, cerca de 5 milhões de crianças entre 5 e 11 anos de idade já foram imunizadas, sem eventos adversos significativos. O sistema de vigilância de eventos adversos dos EUA registrou 8 casos de miocardite em mais de 7 milhões de vacinados, todos com evolução favorável”.
Caso sério
Ao contrário do que dizem os negacionistas apoiados por Bolsonaro, a covid-19 representa um sério risco para crianças. Além da possibilidade mais alta da chamada covid longa, com efeitos duradouros, nestas faixas etárias, o Brasil é um dos recordistas de mortes de crianças. “No Brasil, até a Semana Epidemiológica 48, em 4 de dezembro de 2021, foram hospitalizados por SRAG, confirmados por Covid-19, 19,9 mil casos abaixo de 19 anos. Na faixa etária de menores de 1 ano foram notificados 5.126 casos, de 1 a 5 anos 5.378 casos e, de 6 a 19 anos, 9.396 casos. Em relação aos óbitos, notificados 1.422 por SRAG confirmados por Covid-19, 418 em menores de 1 ano, 208 de 1 a 5 anos e 796 de 6 a 19 anos”, aponta a Fiocruz.
Também pesa sobre as crianças, a prevalência de casos de Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica associada à Covid-19 (SIM-P). “64% das crianças e adolescentes acometidos tinham entre 1 e 9 anos de idade, com necessidade de internação em UTI de 44,5% das crianças hospitalizadas e letalidade de 6%. A SIM-P é uma grave complicação da infecção pelo Sars-CoV-2 em crianças, uma condição que gera inflamações em diferentes partes do corpo, incluindo coração, pulmões, rins, cérebro, pele, olhos ou órgãos gastrointestinais”, alertam os cientistas.
Brasil é um dos piores do mundo em mortes de crianças por covid-19
Saúde mental das crianças
As crianças também possuem um papel especial na disseminação do vírus. Em razão da frequência escolar e da natureza das atividades comuns, como brincadeiras, elas acabam servindo de vetores do vírus. Sem controle da disseminação, o mundo fica suscetível ao surgimento de novas variantes, que se beneficiam da circulação intensa. “Embora crianças adoeçam menos por Covid-19 e menos frequentemente desenvolvam formas graves da doença, elas transmitem o vírus na comunidade escolar e também fora dela”.
A ONU já classifica a covid-19 como “desastre geracional” em relação às perdas educacionais. Uma vacinação ampla para os mais jovens, aliada a medidas como uso de máscaras, garante a segurança necessária para a continuidade do convívio e dos estudos. “A vacinação de crianças é, portanto, uma alternativa robusta para garantir a continuidade de oferta de escola na forma presencial (…) O retorno às atividades escolares presenciais de forma regular permite a identificação e o cuidado de alunos com diferentes vulnerabilidades, muitas acentuadas pela pandemia. Dentre elas, as questões emocionais e o resgate das situações de evasão escolar após longo período sem escola”.
Balanço
Desde setembro o Brasil enfrenta a pandemia “às cegas” sem dados concretos sobre a realidade do surto. Mesmo assim, o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) apontou hoje (28) 171 mortes no país. Durante a pandemia de H1N1, em 2009, por exemplo, as mortes pelo vírus no país estavam na casa de 20 por dia. Desde o início do surto de covid-19, em março de 2020, ao menos 618.705 pessoas morreram, número seguramente subnotificado. Também nas últimas 24 horas, houve registro de 8.430 novos casos, totalizando 22.254.706.