Para entidades, houve 'aumento de hostilidade e violência' contra grupo minoritários
A partir das 9h desta terça-feira (24, no horário de Brasília), o governo Bolsonaro irá a julgamento pelo Tribunal Permanente dos Povos (TPP), sob a acusação de ter cometido uma série de crimes contra a humanidade. A 50ª sessão do chamado tribunal de opinião será realizada simultaneamente em São Paulo e Roma. É a segunda sessão consecutiva tendo o Brasil como tema – a primeira envolveu danos ao Cerrado.
“Pandemia e autoritarismo. A responsabilidade do governo Bolsonaro pelas sistemáticas violações dos direitos fundamentais da população brasileira cometidos pela políticas impostas na pandemia de covid-19” é o nome oficial do evento. O TPP recebeu uma solicitação de quatro entidades: Comissão Arns de Direitos Humanos, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Coalizão Negra por Direitos e Internacional de Serviços Públicos (ISP), que apontam “aumento da hostilidade e da violência” contra grupos minoritários. O julgamento terá transmissão pelo canal da Comissão Arns no YouTube, pelos canais da Coalizão Negra, da Apib e da ISP (o sindicato global PSI, na sigla em inglês.
Agravamento da pandemia
“(As entidades) Sustentam que o presidente da República do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, e seu governo contribuíram intencionalmente para o agravamento da pandemia no país, com seu discurso sobre medidas de proteção sanitária, com a recomendação de tratamentos ineficazes e com a demora e falta de transparência na aquisição de vacinas para os brasileiros”, relata o TPP. Assim, durante a audiência pública, o júri deverá verificar se houve violações e crimes contra a humanidade por por parte do presidente e seu governo, atingindo as populações negra e indígena, além dos trabalhadores no setor de saúde.
A sessão, que vai até amanhã (25), terá formato híbrido, com eventos presencial e on-line. Um tribunal será instalado no Salão Nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no Largo São Francisco, região central da capital paulista. Representantes do TPP e o júri internacional participam virtualmente.
Pela acusação, farão uso da palavra as advogadas Eloísa Machado, professora de Direito Constitucional da Fundação Getulio Vargas, e Sheila de Carvalho, da Coalizão Negra, e o advogado Maurício Terena, da Apib. A defesa deverá ser feita por um representante designado pelo governo brasileiro. Já o júri será presidido pelo jurista e ex-juiz italiano Luigi Ferrajoli, filósofo e professor da Universidade Roma Tre. Aos 81 anos, é um dos principais pensadores do Direito e crítico da execução da pena antes do trânsito em julgado (ou seja, antes de esgotados todos os recursos).
Criado em 1979, o TPP é, como se apresenta, “um tribunal de opinião internacional com competência para julgar qualquer crime grave cometido contra povos e minorias”. Suas decisões não têm efeito do ponto de vista jurídico para condenações, mas têm peso simbólico e influência.
Voz e visibilidade às vítimas
Assim, o júri terá 12 integrantes, de diversas nacionalidades e especialidades, incluindo o brasileiro Rubens Ricupero, diplomata e ex-ministro. Além dele, Alejandro Macchia (cardiologista argentino), Boaventura de Sousa Santos (professor emérito de Sociologia da Universidade de Coimbra), Clare Roberts (ex-presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos), Eugenio Raúl Zaffaroni (professor emérito da Universidade de Buenos Aires), Jean Ziegler (professor de Sociologia da Universidade de Genebra), Joziléa Kaingang (geógrafa e antropóloga brasileira da etnia Kaingang), Kenarik Boujakian (jurista e magistrada brasileira, nascida na Síria), Luís Moita (professor de Relações Internacionais da Universidade Autônoma de Lisboa), Nicoletta Dentico (jornalista e escritora), Vercilene Kalunga (advogada especializada em Direito Agrário e quilombola do Quilombo Kalunga) e Vivien Stern (intgrante da Câmara dos Lordes do Reino Unido).
Em entrevista ao programa Revista Brasil TVT, a jornalista Laura Greenhalgh, diretora da Comissão Arns, falou sobre o julgamento. Mais que uma condenação, observou, é um “momento de reflexão, de dar voz às vítimas desses processos, dar voz e visibilidade internacional”. (Assista aqui, a partir do quarto minuto.)