Na Fope, alunos simulam operações militares, sob os olhares de instrutores fardados - Reprodução/Facebook
A chegada de Jair Bolsonaro à presidência fez crescer no Brasil o número de escolas paramilitares para doutrinar crianças. A questão é tema de reportagem da jornalista Vanessa Lippelt, publicada no site Congresso em Foco nesta quarta-feira (1º). Ela acompanhou as atividades de duas dessas instituições: a Força Pré-Militar Brasileira, conhecida como Fope, e a Academia Militar Mirim. Ambas dirigidas por pessoas sem formação militar, mas próximas a militares da reserva e de políticos bolsonaristas. E não escondem o alinhamento com o governo.
Sob pretexto de preparar crianças e adolescentes para o ingresso nas Forças Armadas, essas escolas paramilitares têm expandido a sua atuação em vários estados, onde realizam seletivas para novos alunos. A Fope apresenta uma estrutura hierárquica similar às instituições militares. Os alunos se dividem em grupamentos, conforme a idade, e chamados por “nomes de guerra”. Os uniformes, de uso obrigatório, são compostos por boinas, camiseta preta com a estampa de uma caveira além de calça camuflada.
A inspiração no Batalhão de Operações Especiais (Bope), da Polícia Militar do Rio de Janeiro, vai além das vestimentas. “A pele do inimigo eu pus no mastro da bandeira, por isso sou chamado faca na caveira”, são versos de uma canção para treinamento físico militar (TFM) que consta da apostila da Fope.
Já na Academia Militar Mirim, os instrutores não podem ser chamados de “tios”. “Aqui é senhor e senhora”, explica o divulgador do curso. Além disso, os pais são instruídos a não acompanharem as aulas. “As primeiras oito aulas são importantíssimas e a gente pede que vocês deixem seus filhos com a gente. Você não vai poder participar porque a disciplina em 90% dos casos não combina com pai e mãe”.
Bordão nazista
Maurício Almeida, responsável pela dita “academia”, afirma que não tem “nenhuma” ideologia aplicada ao curso. Em vídeos expostos na internet, porém, é possível assistir aos alunos encerrando suas atividades com o brado “Brasil Acima de Tudo”, lema preferido de Bolsonaro e dos bolsonaristas. Aliás, inspirado no bordão “Alemanha acima de tudo”, entoado por Adolf Hitler e seus seguidores nos anos 1930.
Já na página da Fope, no Facebook, é possível ver várias fotos de crianças e jovens portando simulacros de armas de fogo, emulando operações militares, sob os olhares de instrutores fardados. Ainda assim, a organização nega o rótulo de paramilitar.
Após investigar os processos de seleção para esses cursos, Vanessa Lippelt chega a comparar as escolas a organizações nazistas, como a juventude hitlerista. Para Daniel Cara, doutor em Educação, mestre em Ciência Política e professor da Universidade de São Paulo (USP), essas academias se apropriam da estrutura de formação de escoteiros e bandeirantes, mas de maneira “desvirtuada”, fazendo proselitismo do pensamento e das práticas da extrema direita.