Segundo dados do MapBiomas, nos últimos 30 anos, a Bacia do São Francisco perdeu 50% da superfície da sua água natural - Cleferson Comarela
Com mais de 2.800 km de extensão, a Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco é a terceira maior do país e corresponde a cerca de 8% do território nacional. Com nascente em Minas Gerais, a bacia se estende até o Oceano Atlântico, onde deságua na divisa dos estados de Alagoas e Sergipe.
Nesse percurso, o Rio São Francisco passa por mais de 500 municípios e gera energia através de cinco usinas hidrelétricas, sendo elas: Sobradinho, Apolônio Sales, Paulo Afonso, Luiz Gonzaga e Xingó.
Mas, dados de um estudo feito em junho pelo MapBiomas, uma rede colaborativa formada por ONGs e universidades que analisa as transformações do território brasileiro, devido à má gestão das águas, nos últimos 30 anos, a Bacia do São Francisco perdeu 50% da superfície da sua água natural.
A transposição do Rio São Francisco
Segundo Washington Rocha, coordenador da equipe Caatinga no Mapbiomas, o principal motivo da fuga da água são as ações humanas. “Já tivemos uma perda na entrada, ou seja, as cabeceiras estão jogando menos água, porque estão sendo desmatadas e o desmatamento provoca o escoamento superficial e não a manutenção das águas para serem produzidas a partir das nascentes, então já há uma redução na entrada", explica.
Leia: Bolsonaro não levou água ao Nordeste: transposição do São Francisco estava 90% feita em 2018
Ele também ressalta que os conflitos do hidronegócio tem impacto na bacia. "A gente também percebe que é algo que vem se reproduzindo é o conflito do uso de água. Isso a gente vê claramente no trecho dos perímetros irrigados do São Francisco, principalmente na região de Petrolina, Juazeiro e adjacências onde nós percebemos que esse processo é mais acentuado”, aponta.
Washington analisa também como a transposição afeta os recursos hídricos. “Cabe também registrar que nós temos eixos da transposição que já estão ativos e isso significa uma fuga de água que inicialmente foi calculada; mas numa situação onde não se esperava que você tivesse redução dos recursos hídricos. As obras da transposição do Rio São Francisco iniciaram em 2007 visando a construção de 720 mil metros de canais para transferência de 1 a 3% das águas do rio”, afirma o coordenador da equipe Caatinga no Mapbiomas.
Leia mais: Sem previsão de retorno da água da Transposição, moradores temem colapso
O bioma e as mudanças climáticas
Com esse projeto, muitas famílias foram beneficiadas com as águas do São Francisco, mas, de acordo com Washington, sem a devida revitalização do Rio, além da vida das pessoas, o bioma Caatinga também está em perigo e as mudanças climáticas causadas pela perda da vegetação podem ficar ainda mais agressivas no semiárido.
“A bacia São Francisco está em 3 biomas: além da Caatinga, Cerrado, tem também a Mata Atlântica. As projeções, a partir desse cenário, que são feitas por diversos estudiosos, principalmente lá do IPCC (Painel Intergovernamental), é de um aprofundamento dessas condições climáticas; elas se tornariam mais extremas [no Semiárido]. Então, seria um cenário de maior risco para os recursos hídricos, eles estariam mais comprometidos numa situação dessas de aumento de temperatura e de tendências”, destaca.
Leia também: Desertificação persiste na Caatinga, com perda de 40% de superfície de água em 3 décadas
As mudanças climáticas e a fauna do rio
Devido aos impactos, espécies como os peixes matrinxã e pirá são consideradas extintas em partes da Bacia do São Francisco. Sérgio Xavier, coordenador do Projeto Hidrosinergia, do Centro Brasil no Clima, que está desenvolvendo o laboratório de economia regenerativa do São Francisco, apresenta ações que podem ajudar a reduzir a perda de água.
“Outra ação fundamental é o reflorestamento, recompor áreas degradadas, não só no bioma da Caatinga, do Cerrado, mas é importante também recompor a Amazônia. O Rio São Francisco é formado por chuvas que vêm da Amazônia, de outras regiões do Brasil, esses ciclos são todos interligados, portanto, zerar desmatamento, recuperar, replantar, reflorestar é outra ação fundamental nesse processo”, destaca o coordenador do projeto, que analisa o impacto dos agrotóxicos no rio e na Caatinga.
Continue no tema: Nova lei dos agrotóxicos preocupa trabalhadores rurais e pesquisadores no Vale do São Francisco
O uso de agrotóxicos
“Além disso, tem áreas no rio com assoreamento, com uso de agrotóxicos que vão para o rio em áreas que são hoje de agricultura, que estão na borda do rio, que estão juntos dos afluentes e acabam carregando um conjunto de venenos que são usados para combater pragas. Enfim, os famosos agrotóxicos, isso é também outro desafio. É um conjunto de ações que estão previstas no plano de revitalização e precisam ser implementadas. A ideia é criar uma economia na bacia do São Francisco que seja regeneradora dessas riquezas naturais e não o contrário, como é hoje”, conclui o coordenador.
Fonte: BdF Pernambuco