Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
As sucessivas quedas nos índices de alcance da vacinação contra a poliomielite podem levar o Brasil a voltar a ter registros da doença. Desde 2015 a cobertura vacinal em solo nacional está abaixo do mínimo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que é de 95%. Fora desse patamar, a população não pode ser considerada protegida.
O presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Juarez Cunha, explica que há várias causas para o fenômeno conhecido como hesitação vacinal, quando há vacina disponível, mas as aplicações não acontecem. Um dos motivos é a falta de conhecimento sobre as doenças.
O Brasil não tem relatos de infecções desde 1989 e é considerado livre de circulação do poliovírus desde 1994, segundo certificação da OMS. Mas o vírus ainda circula no planeta e o risco é real.
Ele conta que, assim como o Brasil, Israel havia relatado o último caso em 1989. No primeiro semestre, foram registrados sete casos no país. "Nós, que estamos com cobertura abaixo de 80%, sem fazer a vigilância de paralisia flácida e sem fazer a vigilância ambiental – que é bem interessante para detectar o vírus em esgotos – nos coloca em risco e é uma informação muito preocupante."
Dados coletados em 2021 mostram que a primeira dose da vacina chegou a apenas 67% do público alvo no Brasil. Os reforços tiveram resultados ainda piores e chegaram a apenas 52% das crianças.
Transmissão e sintomas
Além dos baixos índices de imunização, pesa para o Brasil a falta de saneamento básico. Quase metade da população não tem coleta de esgoto e 35 milhões não tem água tratada.
A poliomielite é transmitida principalmente pela boca por meio do contato com fezes contaminadas ou com gotículas de uma pessoa infectada. Água e alimentos podem ser meios de propagação.
Depois que o vírus entra na corrente sanguínea, o caminho está aberto para que ele chegue ao sistema nervoso. Os sintomas mais leves são febre, dor de garganta, náusea, vômito e constipação. Mas nas formas graves da doença, que atingem principalmente crianças com menos de cinco anos, a doença causa paralisia, geralmente nas pernas.
História
A erradicação da poliomielite foi uma conquista histórica para a saúde pública brasileira, que sofreu com surtos durante todo o século XX. Nos anos 1950, epidemias graves atingiram diversas cidades e, na década seguinte, o país começou a campanha de imunização em massa.
Ainda assim, o processo caminhou com organização insuficiente e sem conseguir controlar a doença. Entre 1968 e 1989 foram registrados mais de 26 mil casos.
Foi somente na década de 1980, com incentivo de iniciativas internacionais, que o poder público passou a determinar dias específicos com campanhas massivas para a vacinação de todas as crianças de até cinco anos de idade. Em três anos, a incidência caiu para quase zero.
Em 2021, o país completou dez anos de uso da vacina injetável com o vírus inativado para as primeiras doses. O método mais eficaz e seguro substitui as conhecidas gotinhas, que contém o vírus atenuado.
No entanto, o avanço de uma década não pode ser comemorado frente à baixa cobertura vacinal.
"Para que a poliomielite não volte, precisamos sim ter cobertura de 95%. É o que sempre falamos: proteção das vacinas passa, não só pela proteção do indivíduo, mas da coletividade, para podemos ter imunidade coletiva. Termos cobertura vacinal de 80% ou menos é um risco muito grande para o nosso país", conclui Juarez Cunha.