Foto: Marina Ramos/Câmara dos Deputados
É estarrecedora a posição assumida por Arthur Lira, presidente de um poder da República, diante dos ataques do bilionário e militante da extrema-direita Elon Musk às instituições brasileiras.
Primeiro disse que não tinha nada a dizer sobre a flagrante investida contra a soberania nacional.
Depois, pressionado para colocar em votação o PL 2630, o PL das Fake News, relatado pelo deputado Orlando Silva, do PCdoB de São Paulo, Lira saiu-se com essa: "O PL 2630 está fadado a ir a lugar nenhum. Não tivemos tranquilidade do apoio parlamentar para votar com a maioria."
Entendeu? Na visão de Lira, a culpa da internet ser uma terra sem lei no Brasil e terreno fértil para a disseminação de discursos de ódio, antidemocráticos e golpistas é do projeto de lei que, ainda que tardiamente, tenta regulamentar a atuação das big techs, algo já em vigor em muitas democracias avançadas ao redor do mundo.
O presidente da Câmara dos Deputados ainda fez coro com o bolsonarismo mais tosco ao afirmar que o texto de Orlando Silva contraria a liberdade de expressão.
Por fim, anunciou a substituição do relator por um nome ainda não escolhido e a criação, pasme, de um grupo de trabalho que terá 45 dias para elaborar um nova proposta de projeto de lei. Tudo isso escudado por decisão do colégio de líderes, segundo Lira.
Saídas engenhosas à parte, é óbvio que Lira é contra a regulamentação das redes sociais, seja pelo forte lobby das plataformas ou porque, dando vazão à sua alma bolsonarista, concorda com a tese mentirosa, esdrúxula e extremista de cerceamento da liberdade de expressão.
E essa história de criar comissão (o PL 2630 já tramitou por várias comissões) todo mundo conhece em Brasília: serve apenas para ganhar tempo e empurrar com a barriga até que o assunto suma do noticiário. No bom português, desse mato não sairá coelho.
Triste democracia a nossa que vive garroteada por uma maioria de parlamentares de tão baixa extração. E não é de conservadorismo que estou falando, mas de fisiologismo, obscurantismo, terraplaniismo e déficit de convicção democrática.
Rendo aqui as minhas homenagens aos deputados e senadores do campo progressista e democrático que são forçados a conviver diariamente com essa turma. Não lhes invejo a sorte. E também ao governo Lula que, em nome de seu compromisso com a governabilidade, não tem outra opção que não seja negociar, negociar e negociar, engolindo sapos cada vez maiores e indigestos.
Lembro de uma história contada pelo jornalista Franklin Martins, nos tempos em que ele cobria o Congresso Nacional. Despois de uma sessão repleta de baixarias, os jornalistas comentavam com o doutor Ulisses Guimarães, então presidente da Casa, sobre o nível rasteiro de muitos deputados. Do alto de sua sabedoria, Ulisses, premonitório, disparou: "Isso porque vocês ainda não viram o que vem por aí."
Bingo!