Há uma estratégia no Ministério da Fazenda, mas que paira no ar devido à falta de uma estratégia de governo.
O que a Fazenda tem feito é ganhar tempo, melhorar um pouco a disponibilidade de recursos, enquanto o governo, como um todo, define uma estratégia clara de desenvolvimento.
O arcabouço fiscal surgiu devido à pressão de tempo. Se não fosse criada uma nova lei, haveria a renovação automática do teto de gastos, sufocando definitivamente o governo.
Conseguiu-se uma ampliação dos gastos e da base de cálculo do crescimento da despesa para os anos seguintes.
As despesas podem crescer até 70% da variação real da receita (receita corrigida pela inflação). Existe uma banda de variação de 0,6% a 2,5% para o crescimento anual da despesa primária.
Isso significa que, mesmo com aumento expressivo na arrecadação, o crescimento da despesa não poderá superar 2,5% ao ano. Por outro lado, em momentos de baixa arrecadação, as despesas não poderão crescer menos do que 0,6% ao ano.
Pelos cálculos da Fazenda, o cumprimento dessas condições poderá permitir um gasto adicional de até R$100 bilhões em 2026.
Por outro lado, anda-se no fio da navalha, com o poder que a Faria Lima, aliada à mídia corporativa, ganhou de manipular o dólar e as taxas longas. Na Fazenda, demarca-se o mercado entre sistema bancário convencional e as assets – os fundos de investimento, característicos da Faria Lima.
Os bancões ganham com a economia em ordem. Seu lucro vem do crédito e de outras operações que exigem um mínimo de previsibilidade. Já a Faria Lima ganha em cima da volatilidade e, desde que descobriu seu poder de manipular as taxas, passou a atuar politicamente, contando com um cúmplice poderoso – o atual presidente do BC, Roberto Campos Neto.
O terremoto atual no câmbio e taxas começou com suas declarações no seminário da XP em Nova York, quando inverteu os prognósticos de melhoria dos fundamentos da economia.
Desde que o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas, montou a jogada da década – com a privatização escandalosa da Sabesp – tornou-se o candidato preferido da Faria Lima. Os mesmos agentes que espalham o terrorismo da gastança calaram-se ante as loucuras de Paulo Guedes e, agora, apostam na alternativa Tarcisio.
Com os níveis atuais e futuros da Selic, essa estratégia poderá ser facilmente engolida por uma Faria Lima politizada.
O grande problema da estratégia da Fazenda é o tempo político e a inação do atual Ministério de Lula. Nas últimas semanas, Lula tem dado alguns sinais de que está despertando para a situação política, reclama planos, criatividade do Ministério, mas até agora não consolidou um programa de governo com prazos e metas.
Ao mesmo tempo, os partidos políticos de esquerda e centro só agora começam a se articular, e de forma muito tímida. Não se trata apenas de um problema de comunicação pública, mas de projeto de país. Hoje em dia a grande disputa não é entre esquerda e direita, mas entre civilização e barbárie.
A grande arma da direita é o exercício continuado do preconceito e do individualismo exacerbado. A arma da civilização precisa ser a solidariedade, o trabalho colaborativo. Mas não bastam as boas intenções. Há que se ter um conjunto articulado de ideias e de ações, mobilizando estruturas de governo, associações empresariais e de trabalhadores, cooperativas e movimentos sociais, universidades, institutos de pesquisa, a classe artística, em suma, os setores que não sucumbiram à selvageria.
Hoje em dia há um enorme desânimo e descrença em relação às possibilidades da civilização virar o jogo. Esse desânimo é sinal da enorme demanda não atendida por otimismo. E, por ser enorme, pode-se mobilizar uma enorme parcela da opinião pública através de planos e ideias claras sobre os rumos a seguir.