Você até pode analisar o desempenho do PT nas eleições municipais olhando para a parte cheia do copo: o partido passou de 183 prefeituras conquistadas em 2020, para 252 agora, aumentando em 76% a população governada; o PT venceu em Fortaleza, a maior capital do Nordeste; o lulismo não se saiu mal, pois aliados do governo obtiveram vitórias importantes, como no Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Belém; das nove disputas do PL nas capitais, no segundo turno, o partido de Bolsonaro perdeu em sete; a extrema-direita bolsonarista projetava eleger mil prefeitos, mas acabou emplacando pouco mais de 500.
Contudo, seria tapar o sol com a peneira não reconhecer que a performance do PT esteve bem aquém do esperado para um partido que governa o Brasil, possui enorme capilaridade em todo o país e sólido capital político, eleitoral e social.
Deixando de lado 2016, quando o partido foi alvejado pelo golpe contra Dilma Rousseff, e 2020, eleição em que sentiu ainda fortemente os efeitos do lawfare, que culminou com prisão ilegal de Lula, o partido elegeu 411 prefeitos, em 2004, 547 prefeitos, em 2008, e 638, em 2012, governando capitais e cidades médias importantes. Se viajarmos um pouco mais no tempo, vale lembrar que, em 1988, o partido venceu as eleições em São Paulo, Porto Alegre e Vitória, só para citar alguns exemplos. As gestões inovadoras e participativas do PT fizeram história.
São diversos os fatores que contribuíram para a queda na preferência pelo partido nas eleições deste ano. Da falta de um discurso mais antenado com a questão do empreendedorismo às debilidades na disputa ideológica e cultural por corações e mentes, passando pelas falhas de comunicação que fazem o PT perder de goleada nas redes para a extrema-direita, são várias as causas que ajudam a entender a votação declinante no partido. A burocratização de parte significativa das direções petistas, em detrimento do trabalho de base junto ao povo, e as mudanças profundas no mercado de trabalho também pesam de forma considerável.
Mas não dá mais para seguir tocando a bola para os lados e fingir que está superado o dano à imagem do partido causado por uma caçada midiática-jurídica-parlamentar sem precedentes na história do país.
As realizações do governo Lula, por mais benefícios que tragam para a população, não têm o condão de, isoladamente, reverterem a visão distorcida e negativa que segmentos expressivos da sociedade têm do PT, especialmente no Centro-Oeste, em maior escala, mas também no Sul, Sudeste e Norte, tanto nos estratos médios como nas classes populares.
Desde 2016, quadros qualificados do partido vêm perdendo eleições pelo simples motivo de pertencerem ao PT. Muitos eleitores preferem votar em qualquer um, desde que seja para impedir a vitória de um petista.
Isso vem acontecendo com frequência. Na eleição municipal desse ano, o caso de Porto Alegre talvez seja o mais emblemático. Na capital gaúcha, o eleitorado decidiu reeleger um prefeito com públicas e notórias responsabilidades pela maior tragédia ambiental do estado apenas para derrotar uma petista, a combativa e preparada deputada Maria do Rosário.
Penso ter chegado a hora de o partido enfrentar com métodos científicos o problema do antipetismo, porque, por ser de extrema complexidade, a questão não tem solução simples, E é importante frisar que o antipetismo atinge também, em maior ou menor grau, toda a esquerda.
Por que não fazer uma ampla pesquisa nacional sobre os motivos da rejeição ao partido? De posse desses resultados, a direção traçaria políticas e elaboraria estratégias para tentar desatar, com método e racionalidade, os nós que abalam a imagem do PT no imaginário coletivo.
Segundo algumas pesquisas, o contingente de bolsonaristas raiz na população gira em torno dos 20%. Estes parecem caso perdido para um projeto de país democrático, humanista, inclusivo e soberano, já que compartilham dos valores do neofascismo brasileiro.
Fora dessa parcela, existe um mundo de gente a ser disputada, conquistada ou reconquistada, já que é grande a quantidade de pessoas que se dizem antipetistas hoje, mas que já simpatizaram e votaram no PT em passado recente.
É urgente que o partido formule políticas capazes de atrair essa gente de volta. Nada pode ser mais importante do que se armar politicamente para enfrentar o antipetismo, que é o anticomunismo com nova roupagem dos dias atuais.