Foto: Ricardo Stuckert
Política tem coisas imprevisíveis. Às vezes uma fagulha inesperada basta para produzir incêndios no panorama político. A derrubada pelo Congresso Nacional do decreto do presidente Lula com pequenas modificações no IOF (o governo recorreu ao STF), que tinham como base a justiça tributária e o equilíbrio das contas públicas, desencadeou uma crescente onda de críticas ao Legislativo nas redes sociais, tachando-o de inimigo do povo, pior da história e por aí vai.
Para piorar sua imagem pública, o Congresso aprovou o aumento do número de deputados. medida que conta com alta reprovação dos brasileiros, segundo algumas pesquisas já divulgadas.
O fato é que pela primeira vez em mais de dois anos e meio de mandato, vemos o governo unificar seu discurso e sua estratégia, com o presidente Lula, o ministro Haddad, demais ministros e parlamentares do campo progressista batendo firme na tecla da taxação dos super-ricos, da justiça social através de uma tributação justa e da urgência da aprovação do projeto que isenta de pagamento de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil.
Mais do que um discurso, caiu no colo do governo uma marca de gestão, que, registre-se, ele está sabendo aproveitar. E o fenômeno da mudança na opinião pública não se limita apenas às redes. Ontem testemunhei uma conversa de dois trabalhadores de uma lanchonete se queixando de que "só pobre paga imposto no Brasil."
O PT tem dado uma contribuição importante para esse começo de virada com a produção de vídeos criativos e contundentes, nos quais desnuda a injustiça tributária brasileira, e que têm viralizado na internet. Aliás, o lema da campanha petista é um achado político e de marketing: "Taxação BBB: Bancos, Bets e Bilionários."
Deputados e senadores do Centrão e da extrema-direita, que compõem hoje a grande maioria do Congresso Nacional, reagem da forma esperada, em linha com seu padrão político rasteiro, acusando o o governo de promover a "polarização social" e de "jogar pobres contra ricos."
Eles ameaçam não aprovar mais nenhuma matéria de interesse do governo, indicar um bolsonarista raiz para a relatoria da CPI do INSS, além de colocar em votação o projeto de anistia para os golpistas de 8 de janeiro, para beneficiar Bolsonaro.
É curioso notar que muitos congressistas que se elegem com o apoio de banqueiros, grandes empresários e agronegócio e usam seus mandatos para defender as causas dos ricaços, em detrimento dos pobres, viram bicho quando a sociedade, finalmente, passa a enxergar essa realidade.
O sorriso amarelo da turma da GloboNews é outra evidência do acerto do novo caminho adotado pelo governo. Esperavam que Lula seguisse prisioneiro exclusivo das chantagens do Congresso, colhendo derrotas até chegar enfraquecido em 2026. Quebraram a cara.
"Um presidente não rompe com o Congresso", foi taxativo Lula, durante entrevista na Bahia. Claro que as negociações entre os poderes devem ser retomadas. Só que em um patamar que respeite a independência e a a harmonia entre os poderes, com "cada macaco no seu galho", como diz o presidente da República.