O consagrado samba gravado por Beth Carvalho cai como uma luva no caso da traição do PMDB do estado do Rio de Janeiro à presidenta Dilma e ao ex-presidente Lula. Minha mãe me ensinou que o pior dos defeitos de uma pessoa é ser mal-agradecida.
O não reconhecimento a quem nos estende a mão costuma revelar desvios insanáveis de caráter. E os que sentem beneficiados pela traição que ponham as barbas de molho, pois sua hora também vai chegar.
Isso porque quem trai hoje, trai também amanhã e depois de amanhã. É coisa de DNA. Lembra a fábula do escorpião que depois de muito insistir conseguiu que o sapo lhe desse uma carona nas suas costas para atravessar o riacho. Quase chegando na outra outra margem, o escorpião crava o ferrão no sapo e se desculpa : "Me perdoe, mas é da minha natureza."
Durante os dois mandatos do governador Sérgio Cabral saltava aos olhos de qualquer observador minimamente atento que se não fossem os pesados investimentos dos governos de Lula e Dilma, a gestão do PMDB mal e porcamente teria dinheiro para pagar a folha de salários dos servidores e nada mais.
Mas nos enganamos. Hoje, depois que a torneira de Brasília secou, vemos que nem mesmo o pagamento dos funcionários ativos e inativos o governo Pezão/Dornelles é capaz de honrar. E, sem ficarem rubros de vergonha, as autoridades fluminenses apontam o calote na dívida com a União como a panaceia para sua crônica incompetência.
Nunca antes na história republicana uma unidade da federação recebeu tratamento tão privilegiado do governo federal. Bilhões foram investidos em obras de infraestrutura para a Copa e Olimpíada (voltadas principalmente para a mobilidade urbana) em programas sociais (o Rio é recordista de casas no Minha Casa, Minha Vida), convênios e parcerias.
Durante 13 anos, prefeitos e governadores do PMDB se elegeram surfando no slogan marqueteiro "Somando Forças", numa alusão à aliança entre a prefeitura do Rio e os governos estadual e federal.
Longe de expressar uma louvável unidade de ação em prol da população, a punhalada do PMDB nas cotas de Dilma, apoiando o golpe de estado, mostrou que a estratégia foi concebida por puro oportunismo eleitoreiro.
Da parte do PT, a aliança com o PMDB sempre foi vista como necessária para garantir as mínimas condições de governabilidade. No entanto, embora ocupasse sete ministérios e centenas de cargos de ponta, o PMDB raramente cumpriu sua parte no acordo, já que grande de sua bancada de deputados federais há muito vota com a oposição.
Dia desses um militante do PT me chamou a atenção para a trajetória pontilhada de traições do prefeito Eduardo Paes. Traiu seu padrinho César Maia, depois traiu o PSDB e agora o PT. Já em relação a Picciani, "capo" peemedebista no estado, o quadro parece ser mais psicanalítico, pois sabe-se que carrega um forte ressentimento contra Lula, a quem responsabiliza por sua derrota nas eleições para o Senado em 2010.
A maioria dos deputados do PMDB fluminense se somou ao circo de horrores na qual se transformou a votação do impeachment no último domingo, com declarações de voto indigentes que estão a envergonhar o Brasil internacionalmente. Mas, como "o mundo gira e a Lusitana roda", é um consolo saber que a história dispensará aos golpistas e traidores o tratamento devido.