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STF: a responsabilidade política da omissão

Mai 11, 2016

Por João Feres Jr, no GGN                                                         

 

 

“Ministra do STF barra ação de advogado contra decisão de Waldir Maranhão”, esse é o título de uma notícia narrando a decisão de Rosa Weber, que segundo intérpretes do comportamento judiciário tem o claro objetivo de manter o Supremo alheio a questões substantivas e comprometido somente com a lisura dos procedimentos do processo político, no momento atual dominado pelo tema do impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Sim, o STF quer se colocar em um lugar que não existe: fora da política. Se é correta a leitura destes analistas, e ela parece até certo ponto estar, esse coletivo de juízes sofre de um caso grave de alucinação ou será outra a afecção?

É sim alucinatória a pretensão de se colocar fora da política. As decisões do Supremo, como as dos outros poderes são imediatamente e irremediavelmente políticas. Claro que o adjetivo “política” tem muitos significados, mas o mais profundo deles é o que diz respeito à preservação ou defesa da república. Em época de normalidade institucional, a distinção entre o procedimental e o substantivo, ainda que nunca totalmente nítida, pode funcionar como modus operandi de um poder que em si não detém a legitimidade de representar a soberania popular. Em época de crise profunda nas instituições, ou seja, em que a república e a Constituição que a sustenta estão sob risco tremendo, todas as ações se tornam políticas.

A chave para entender momentos de crise não está em nenhum manual de direito constitucional, mas sim em um livro de conselhos para príncipe escrito por um fiorentino do século XV, cujo nome era Niccolò Machiavelli. Entre outras coisas, esse político-filósofo nos ensina que não há ato que não seja político quando a preservação da república está em questão. Assim, deixar de agir é o mesmo que agir errado.

Nossos ministros do Supremo, contudo, tomam a omissão da ação como se fosse opção para preservar o que imaginam ser sua função procedimental. Ao fazerem isso dão liberdade para aqueles que politizaram as instituições; que as submeteram a interesses partidários, facciosos ou pessoais. A lista destas omissões é assustadora. Permitiram que Moro, um contumaz violador das garantias constitucionais de seus acusados, espionasse advogados de defesa, e até a presidente e o vice, e divulgasse ilegalmente o produto de escutas ilegais na mídia. Permitiram que membros politizados do poder judiciário barrassem o direito do cidadão Luis Inácio da Silva de se tornar ministro, engavetando sine die o julgamento do recurso contra decisão tão arbitrária. E o pior de tudo, permitiram que Eduardo Cunha, acusado desde dezembro de crimes de corrupção de monta e com clara motivação política, presidisse um processo de impeachment da Presidente da República na Câmara. A irritação do Ministro Teori com o agendamento do julgamento de ação contra Cunha pelo pleno revelou que havia combinação entre os pares de se “sentar em cima” do processo.

As omissões do Supremo incentivaram o caos institucional. Se antes o Procurador Geral da República sustentava uma fachada de austeridade enquanto seus subordinados atuavam de maneira abertamente politizada na Lava Jato, vazando informações sigilosas para a imprensa e postando no Facebook fotos de participação em manifestações antipetistas, agora ele próprio tomou coragem de vir à público chamar um partido político de organização criminosa e de oferecer denúncia contra Dilma e Lula exatamente na semana do julgamento do impeachment no Senado, baseado exclusivamente em delação premiada do réu confesso Delcídio Amaral.

O legislativo federal encontra-se em estágio avançado de desintegração. E o STF tem seu quinhão de responsabilidade nisso. Até o último minuto, Cunha prosseguiu manipulando votações, caçando o direito de voz de seus opositores e o direito de acesso dos cidadãos à chamada Casa do Povo. Sua destituição foi muito tardia para evitar o caos parlamentar. Os partidos estão muito enfraquecidos. Bancadas temáticas (nome brando para o antigo termo facção) se autonomeiam e reclamam autonomia. Quem quer que seja o chefe do executivo no futuro próximo, vai enfrentar custos altíssimos de transação com o Congresso.

Por fim, as omissões do Supremo têm incentivado o ativismo judicial em níveis nunca antes vistos. Qualquer juiz de primeira instância hoje se acha com poderes para brecar decisões que impactam a nação inteira. O caso mais recente da paralização judicial dos serviços do Whatsapp é exemplo do estado vergonhoso em que se encontra nosso judiciário, não porque tenha acontecido, como muitos possam pensar, mas exatamente porque foi rapidamente solucionado. Enquanto isso, o cidadão Lula tem seus direitos negados em primeira instância e essa negação é sustentada por omissão do Supremo. Se não bastasse isso, e contribuindo para a desmoralização geral, o presidente do Supremo ainda é flagrado negociando um aumento polpudo para a categoria judiciária com o próprio Eduardo Cunha, poucos dias antes deste ser apeado do poder.

Mesmo que possamos imaginar que os ministros do Supremo queiram preservar a aparência da instituição, as consequências de suas omissões são tão terríveis que de maneira alguma justificam essa suposta vaidade. Estão sacrificando a essência em nome de tal aparência. Ou melhor, infelizmente, já sacrificaram. Resta-nos esperar que a história lhes reserve o lugar merecido, que reside entre o esquecimento e o escárnio. Para nós, viventes do presente, contudo, isso não é consolo suficiente.   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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