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Interino, Temer não pode desmontar governo

Mai 21, 2016

Por Rede Brasil Atual                                           

 

 

Brasília – A turbulência das nomeações e demissões desta primeira semana de governo interino de Michel Temer provocou novos protestos de parlamentares e juristas. Para muitos, a maioria das ações de desmontagem de equipes e programas pelo presidente em exercício só poderia ser levada adiante em caso de confirmação da saída definitiva da presidenta afastada – que até 180 dias para se defender.

O jurista Lodi Ribeiro afirma ter estudado a fio os preceitos da Constituição Federal sobre o assunto. Segundo ele, durante o afastamento de um presidente de fato – no caso de Dilma – o vice deveria assumir “precariamente”, apenas com objetivo de "substituição" da presidenta afastada no cargo. Por isso, só poderia tomar medidas de urgência, "sem alterações na ordem vigente e no programa de governo do presidente eleito", defende Ribeiro, em artigo veiculado hoje (20), no site Consultor Jurídico, assinado com a advogada Nina Pencak.

"Entender que o vice, em exercício precário possui competência para colocar em prática reformas institucionais, econômicas e sociais e/ou romper com os programas instaurados pelo presidente afastado é assumir que o constituinte permitiu a ocorrência de gravíssimo periculum in mora in reverso", argumenta o jurista, ao observar, na expressão em latim, que há a "perigo" da antecipação dessas medidas.

Para ao autores, "o constituinte não conferiu plenos poderes presidenciais ao vice durante o período de afastamento". Em primeiro lugar, porque o vice-presidente não foi eleito para ocupar a função do presidente da República. Em segundo, porque seria "no mínimo leviano" por parte do constituinte assumir periculum in mora in reverso de tamanha monta, aos custos da sociedade brasileira, já que a previsão constitucional é clara no sentido de afastamento temporário. E, por fim, porque "o constituinte não previu que o vice-presidente não estaria alinhado com o presidente, de modo a não dar continuidade ao programa de governo até então praticado e iniciar seu próprio mandato" – como ocorre atualmente.

Ribeiro e Nina destacaram, ainda, que no sistema atual, o vice é eleito para cumprir as suas próprias atribuições constitucionais, podendo vir a substituir a presidente em caso de impedimento temporário, ou sucedê-la, em caso de vacância do cargo. Mas, para isso, dando cumprimento ao programa apresentado por ambos (Dilma e Temer) e que foi sufragado pelos eleitores.

Na mesma linha, o constitucionalista e cientista político Jorge Rubem Folena de Oliveira afirmou que o vice-presidente não tem atribuição para instituir novo governo nem criar ou extinguir cargos e muito menos nomear ou desnomear ministros de Estado. "Caberia a ele se limitar a aguardar, em silêncio e com todo o decoro possível, o resultado final do julgamento do impedimento, no Palácio do Jaburu, sua residência oficial". Folena ressaltou que a Constituição não diz que o seu governo estará destituído. "O governo eleito permanece, com os ministros nomeados pela presidenta, que devem permanecer até o julgamento final do processo de impeachment".

Erros primários

O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), também concorda com os argumentos apresentados pelos juristas. De acordo com o deputado, além de extinguir a Controladoria Geral da União (CGU), o Ministério da Cultura, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, entre outros, a Medida Provisória (MP) 726, sobre mudança dos ministérios apresenta, em sua avaliação, "um conjunto de erros primários".

"Com uma redação confusa, o texto define atribuições para ministérios em áreas distintas da sua atuação, omite temas importantes das ações governamentais na nova estrutura proposta e, além disso, é a base a partir da qual foi nomeado um ministério formado exclusivamente por homens brancos, ricos e muitos deles investigados por corrupção em diferentes inquéritos", ressaltou.

Pimenta inclui, entre "vários erros" já cometidos no governo interino, o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República – para o qual foi designado um general para o comando. "As atribuições desse gabinete, como coordenação das atividades de inteligência federal e coordenação das atividades de segurança das informações e comunicações aborda diretamente setores sobre os quais, ao longo dos últimos anos, houve intensos debates no país em busca de uma formulação adequada e democrática. E mostram, agora, o caráter autoritário e repressivo do governo golpista", disse.

Pimenta considera grave o fato de a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) passar a integrar um gabinete chefiado por um general, com atribuições que colidem com a própria razão de existência do órgão, de natureza civil. "A subordinação da agência de inteligência ao comando de um militar contraria frontalmente tudo aquilo que tem sido construído nas sociedades democráticas – especialmente após as experiências de ditaduras militares – sobre a importância de que essas atribuições sejam de natureza civil."

Interinidade e ilegitimidade

O senador Humberto Costa (PT-PE) questionou até onde pode existir descontinuidade do programa de governo eleito na fase de interinidade. "Se ele (Temer) tudo pode, não estará havendo atropelo à presunção da inocência?", perguntou. Já o deputado Jean Wyllys (Psol-RJ), além de concordar com a tese, lembrou que desde o primeiro dia de governo, o presidente interino tem tomado iniciativas ilegítimas. "Não vamos nos submeter um dia sequer a esse governo ilegítimo", afirmou.

Da mesma forma, o líder do Rede no Senado, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), disse que bastaram poucos dias para o governo Temer mostrar a que veio, além dessa questão da legitimidade e de prerrogativas constitucionais descumpridas. "O presidente interino assumiu prometendo um governo de salvação nacional, mas bastaram os primeiros passos para mostrar a ação desastrada da nova administração. Vimos que, antes de mais nada, Temer precisa é salvar seu governo dos novos ministros", ironizou.

Em entrevista concedida esta semana para o canal russo RT, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também abordou a questão e disse que Temer "deveria se comportar como interino". Lula argumentou que o Senado pode ainda mudar de ideia e a presidente Dilma Rousseff voltar ao poder e é temerária a decisão de fazer tantas mudanças neste período. "Se daqui a três meses a Dilma conquista a vitória no Senado, terá que refazer tudo, um país não pode suportar isso. O governo interino está atuando com muita falta de respeito àquilo que o Senado lhe deu: uma interinidade", acentuou o ex-presidente.

Em defesa de Temer, o jurista e professor Flavio de Leão Bastos afirmou que em caso de afastamento por impeachment, para que possa gerir e administrar o país, o vice precisa de um corpo de ministros de sua confiança. Por isso, vê "de forma quase absoluta a garantia constitucional de presidente em exercício nomear seus ministros". "Não haveria sentido de que, para administrar o país, ele o fizesse com pessoas que eram de confiança do presidente afastado", acrescentou.

O tema tem tudo para ser judicializado, provocar novas polêmicas e esquentar ainda mais o cenário político a partir da próxima segunda-feira (23).

 

 

 

 

 

 

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